As redes sociais tornaram-se um dos principais canais de comunicação política e administrativa no Brasil. Prefeitos, vereadores e gestores públicos utilizam perfis pessoais para divulgar programas de governo, obras e campanhas institucionais, aproximando-se diretamente da população.
Essa prática, no entanto, exige atenção aos princípios constitucionais da impessoalidade e da publicidade (art. 37 da Constituição Federal), além do regime jurídico da liberdade de expressão (art. 5.º). O desafio é equilibrar direito individual à manifestação e limite do uso de recursos públicos.
O tema ganhou relevância com recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial nº 2175480 – SP, envolvendo o ex-prefeito de São Paulo, João Doria, no programa “Asfalto Novo”. O tribunal entendeu haver indícios para prosseguimento de ação de improbidade administrativa por uso de verba pública em publicidade institucional posteriormente replicada em perfis pessoais.
Esse caso amplia o debate sobre os limites entre esfera pessoal e institucional no ambiente digital.
A liberdade de expressão é um direito fundamental assegurado a todos, inclusive aos agentes públicos. No entanto, quando o conteúdo é produzido ou custeado com recursos públicos, ele deixa de ser uma manifestação pessoal para integrar a esfera da publicidade institucional.
O STJ, no caso citado, destacou que imagens e conteúdos financiados com verba pública, quando replicados em perfis pessoais, podem configurar promoção pessoal. Nesse sentido:
A liberdade do gestor em se comunicar permanece válida.
Mas não se admite o desvirtuamento da publicidade oficial em benefício individual.
O princípio da publicidade, previsto no art. 37 da Constituição, garante transparência, legitimidade e controle social dos atos da administração.
Para que esse princípio seja respeitado, a comunicação deve ocorrer por canais oficiais e institucionais, com identificação clara de sua origem.
Quando perfis pessoais são usados para reproduzir campanhas pagas com recursos públicos, há risco de confusão entre interesse público e autopromoção, violando também os princípios da impessoalidade, moralidade e legalidade.
No REsp 2175480 – SP, o STJ utilizou critérios de proporcionalidade para justificar a continuidade da ação de improbidade:
Adequação: a restrição busca evitar promoção pessoal com recursos públicos.
Necessidade: não se veda por completo a comunicação em redes sociais, mas apenas o uso de material custeado pelo erário em perfis particulares.
Proporcionalidade em sentido estrito: a limitação é razoável e justificada, considerando o equilíbrio entre liberdade de expressão e princípios constitucionais.
Esse julgamento fortalece a compreensão de que a liberdade de expressão não é absoluta e deve ser compatibilizada com o dever de transparência e impessoalidade.
Para evitar riscos jurídicos e fortalecer a transparência, gestores e legisladores devem observar:
Separação de perfis pessoais e institucionais – cada um com finalidade distinta.
Canais oficiais identificados – atos administrativos devem ser divulgados por contas oficiais.
Transparência ativa – campanhas devem indicar custos, fontes e finalidades.
Normas internas de conduta – regulamentos municipais sobre uso de redes sociais.
Controle e fiscalização social – participação do Ministério Público, Tribunais de Contas e sociedade civil.
O caso decidido no Recurso Especial nº 2175480 – SP evidencia que liberdade de expressão e publicidade administrativa devem coexistir de forma equilibrada.
No contexto digital, em que redes sociais ampliam a comunicação direta com cidadãos, é essencial preservar a responsabilidade no uso de recursos públicos e garantir que a publicidade institucional cumpra sua finalidade democrática.
Democracia em rede exige responsabilidade em rede.
Sobre o autor
Prof. Leandro Velloso – Docente de Direito (UNESA) | Pesquisador em Direitos Fundamentais (FDV/ES) | Pós-Graduado pela PUC-SP | Autor de 16 livros | Advogado e Gestor Público com mais de 25 anos de atuação.
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PRISCILA GONZALEZ NAVIA PIRES DA SILVA
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