Prematuridade e atraso de fala: o alerta que as famílias precisam ouvir

JúLIA BOZZETTO
08/09/2025 12h17 - Atualizado há 1 dia

Prematuridade e atraso de fala: o alerta que as famílias precisam ouvir
Divulgação
 

*Angelika dos Santos Scheifer

Pouco se fala sobre a relação entre prematuridade e atraso de fala — e menos ainda sobre a urgência de estimular essas crianças desde cedo. Na prática clínica, é comum ouvir pais de bebês prematuros receberem um conselho que, embora bem-intencionado, é perigoso: “É normal ele falar mais tarde, afinal nasceu prematuro”. O resultado dessa espera é que muitas famílias chegam aos 3, 4 ou até 5 anos com filhos apresentando dificuldades expressivas importantes na comunicação.

Um estudo publicado na Medicine (2019) mostrou que crianças prematuras têm risco significativamente maior de atraso na linguagem expressiva em comparação às nascidas a termo, com impactos que podem persistir na idade escolar. E não se trata apenas de falar mais tarde — há casos em que, mesmo com comunicação estabelecida, permanecem alterações sutis na entonação, inteligibilidade ou uso da voz. Atendo, por exemplo, uma paciente de 13 anos com fala fluente, mas com dificuldades que remontam aos primeiros anos de vida sem acompanhamento adequado.

As causas desse quadro são multifatoriais. O primeiro ponto é neural: ao nascer antes do tempo, o cérebro da criança ainda está em fase de maturação acelerada, um processo que deveria ocorrer no útero. Habilidades fundamentais para a fala — como contato ocular, sorriso social e atenção compartilhada — podem demorar mais a surgir, pois a energia do organismo está voltada para funções vitais.

O segundo ponto é emocional e familiar: o parto prematuro, sobretudo quando inesperado, costuma vir acompanhado de internações, procedimentos médicos e um puerpério mais desafiador. Nessas circunstâncias, o foco da família é garantir a sobrevivência e estabilidade clínica do bebê, deixando a interação social e a estimulação comunicativa em segundo plano. Essa dinâmica foi observada também em pesquisa publicada na Frontiers in Psychology (2025), que revelou que bebês nascidos entre 32 e 36 semanas apresentam defasagens nas habilidades de comunicação social ainda nos dois primeiros anos — e que comportamentos como apontar e manter atenção conjunta são preditores cruciais para o desenvolvimento da linguagem.

A boa notícia é que a intervenção precoce pode mudar esse cenário. Um estudo citado pela Time (2014) demonstrou que a simples iniciativa dos pais de falar com seus bebês prematuros ainda na UTI neonatal — mesmo frases curtas e afetuosas — está associada ao melhor desempenho linguístico aos 18 meses. Cada 100 palavras adicionais ouvidas reduzem o risco de atraso e ampliam as oportunidades de desenvolvimento.

A prematuridade não é desculpa, mas sim um sinal de alerta para atenção redobrada. Cada bebê prematuro precisa ser visto em sua singularidade desde o primeiro instante, para que sua fala, seu jeito e seus talentos possam florescer no tempo certo e com respeito ao seu ritmo. 

Por isso, pais e cuidadores devem celebrar cada avanço — um olhar, um balbucio, um gesto — e buscar orientação profissional o quanto antes para que sejam preparados à oferta de estímulo adequada. E nós, profissionais, temos a responsabilidade de oferecer escuta, dar apoio emocional à família qualificada e, como reforçam Aija et al (2025), treiná-los para a melhor estimulação  desde os primeiros dias em casa. Porque o atraso de fala pode ser prevenido ou minimizado quando ciência, afeto e ação caminham juntos.

*Angelika dos Santos Scheifer é fonoaudióloga, pós-graduada em Avaliação e Reabilitação em Motricidade Orofacial e Distúrbios de Fala e Linguagem, formação avançada em PECS e laserterapia para clínica fonoaudiológica e aprimoração em ação fonoaudiológica no TEA.

Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
JÚLIA KLAUS BOZZETTO
[email protected]


Notícias Relacionadas »