Em momentos de tensões políticas e de revisões da memória histórica, o debate sobre o Estado Democrático de Direito, a anistia e a liberdade de expressão ganha relevância. O professor Leandro Velloso, pesquisador em Direitos Fundamentais, apresenta uma análise que busca compreender os dilemas jurídicos e éticos que atravessam a democracia brasileira e outras democracias contemporâneas.
Um dos pontos centrais levantados por Velloso é a relação entre justiça de transição e verdade factual. Inspirando-se em Hannah Arendt, ele observa que a democracia não sobrevive apenas com normas escritas, mas também com o respeito à verdade:
“Sem o respeito à verdade factual, a política dissolve-se em narrativas concorrentes, tornando o espaço público refém de versões.” (Arendt, 1967).
Nesse sentido, a anistia aparece como tema inevitavelmente controverso. Ao mesmo tempo em que pode representar um instrumento de pacificação social, ela levanta o dilema ético de até onde o Estado pode relevar violações de direitos humanos sem comprometer a própria democracia.
A reflexão de Velloso conduz ao seguinte questionamento:
A democracia pode se sustentar sobre o silêncio?
Ou é preciso relembrar para que os erros não se repitam?
Assim, o professor destaca que a memória coletiva é um componente essencial para impedir que a história seja corrompida pelo esquecimento.
Outro ponto central é a liberdade de expressão, um dos pilares da Constituição de 1988 e dos sistemas democráticos modernos.
Para Velloso, o direito à livre manifestação não pode ser confundido com licença para destruir as bases democráticas:
“Liberdade de expressão não é licença para destruir o próprio espaço democrático que a garante. Dworkin ensina que os direitos possuem integridade, e essa integridade impede que sejam instrumentalizados contra si mesmos.” (Dworkin, 1977).
O professor também recorre à teoria de Jürgen Habermas, ressaltando que a esfera pública precisa de racionalidade comunicativa. Quando este espaço se perde em manipulações e desinformação, abre-se caminho para a corrosão do consenso democrático.
No Brasil, a Lei de Anistia de 1979 continua gerando debates judiciais, políticos e acadêmicos.
“A Constituição de 1988 consagrou o Estado Democrático de Direito como cláusula pétrea, mas permanece a dúvida: podemos continuar ignorando crimes graves contra os direitos humanos sob o manto da anistia ampla, geral e irrestrita?”, indaga Velloso.
Esse dilema mostra como a democracia não pode ser reduzida apenas ao processo eleitoral, mas deve também proteger minorias, direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana.
Para o professor, o Estado Democrático de Direito deve ser constantemente reafirmado, equilibrando memória histórica, justiça e liberdade.
Ele sintetiza o debate em uma frase que ecoa como alerta e guia:
“Sem memória, não há justiça; sem justiça, não há democracia; e sem democracia, a liberdade de expressão se converte em ruído.”
O desafio contemporâneo está em encontrar um equilíbrio entre:
a preservação da memória histórica,
a proteção de direitos fundamentais e
a manutenção de um espaço público livre e democrático.
Nesse cenário, a anistia, a liberdade de expressão e a justiça de transição não devem ser tratadas como conceitos isolados, mas como partes de uma mesma equação ética e jurídica que sustenta a democracia.
Sobre o autor
Professor Leandro Velloso — Docente de Direito da Estácio de Sá (UNESA) | Professor de Carreiras Jurídicas (FDV, Verbo Jurídico, Esfera) | Pesquisador em Direitos e Garantias Fundamentais (FDV/ES) | Autor de 16 livros | Advogado com mais de 25 anos de atuação pública e privada.
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PRISCILA GONZALEZ NAVIA PIRES DA SILVA
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