*Silvia Kelly Bosi
O acesso ao mercado de trabalho para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) continua restrito. Levantamento do IBGE indica que cerca de 85% dos adultos com TEA estão fora da força de trabalho no Brasil, o que corresponde a mais de 1,7 milhão de pessoas. Esse cenário reflete uma lacuna entre a legislação inclusiva existente e a prática cotidiana das empresas.
Nos últimos anos, medidas legais foram aprovadas para ampliar as oportunidades. O Projeto de Lei 5.813/2023, por exemplo, estabelece a integração de bases de dados do Sistema Nacional de Emprego (Sine) com o SisTEA, facilitando a conexão de candidatos com vagas compatíveis. Já a Lei 14.992/2024 obriga o Sine a respeitar padrões de acessibilidade definidos pela ABNT, o que cria condições mais igualitárias de acesso. Além disso, a Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015) garante que o ambiente de trabalho seja acessível e prevê adaptações razoáveis, uso de tecnologia assistiva e suporte individualizado.
Apesar dos avanços legais, estudos recentes mostram que ainda existem barreiras significativas. Pesquisas internacionais identificam dificuldades na contratação de pessoas com TEA relacionadas a processos seletivos pouco adaptados, ambientes de trabalho complexos e ausência de ferramentas personalizadas. No setor de tecnologia, por exemplo, pessoas autistas se destacam em funções como programação, testes e segurança da informação, mas enfrentam obstáculos em áreas como comunicação e colaboração, o que compromete sua permanência e desenvolvimento profissional.
Experiências práticas demonstram caminhos possíveis. A ONG Specialisterne, que atua no Brasil e em outros países, registra índices de inserção profissional superiores a 90% em organizações que estruturam processos de acolhimento e treinamento. Iniciativas corporativas internacionais, como o programa Autism@Work, da SAP, e projetos semelhantes em empresas como Deloitte e Microsoft, também reforçam que políticas claras de inclusão, combinadas com capacitação interna, favorecem tanto a permanência dos colaboradores quanto a inovação organizacional.
Para que a inclusão se torne realidade, é necessário que empresas brasileiras adotem políticas formais, invistam em treinamentos para suas equipes e adequem os ambientes de trabalho. Isso inclui ajustes simples, como organização de rotinas, uso de recursos visuais e redução de estímulos sensoriais, mas também exige acompanhamento contínuo e avaliações regulares dos processos de inclusão. Parcerias com instituições especializadas podem oferecer suporte adicional às equipes de recursos humanos e lideranças.
A inclusão de pessoas com TEA no mercado de trabalho não se resume ao ato da contratação. Ela depende de um esforço conjunto entre Estado, empresas e sociedade para transformar a legislação em prática efetiva. As companhias que avançarem nesse sentido não apenas cumprirão sua função social, mas também se beneficiarão de um capital humano diverso, capaz de gerar soluções inovadoras e novas formas de pensar os processos de trabalho.
*Silvia Kelly Bosi é neuropsicopedagoga, cientista da educação, especialista em desenvolvimento infantil e autismo, palestrante e CEO da Potência – Clínica de Desenvolvimento Infantil. Também é mãe atípica e defensora da inclusão como caminho para uma sociedade mais justa e inteligente. Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
JÚLIA KLAUS BOZZETTO
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