Nos últimos anos, o debate sobre acessibilidade digital deixou de ser periférico e passou a ocupar um lugar central nas agendas corporativas. Esse movimento não aconteceu apenas por uma questão de consciência social, mas também pelo avanço de legislações nacionais e internacionais que consolidaram a acessibilidade como um direito inegociável. Hoje, garantir que produtos, serviços e comunicações sejam acessíveis não é mais uma escolha — é uma obrigação legal e uma responsabilidade ética.
Assim como empresas se organizam para atender às normas de proteção de dados ou às regras de governança ambiental, o compliance inclusivo precisa ser visto como parte do mesmo compromisso. A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) e normas internacionais, como o Americans with Disabilities Act (ADA) e a Diretiva Europeia de Acessibilidade, são exemplos de regulamentações que estabelecem parâmetros claros. Ignorar essas normas significa expor a organização a riscos jurídicos e, talvez ainda mais grave, a riscos reputacionais.
Segundo relatório da McKinsey & Company, empresas que priorizam diversidade e inclusão têm 35% mais chances de conseguir rendimentos acima da média do seu setor. Isso evidencia que compliance inclusivo não deve ser encarado como burocracia, mas como estratégia de competitividade e sustentabilidade do negócio.
A legislação, por si só, estabelece limites e sanções. Mas é no campo da ética que a acessibilidade revela seu potencial transformador. A verdadeira equidade se constrói quando a organização enxerga a inclusão não apenas como regra a ser cumprida, mas como valor a ser vivido.
Incorporar a acessibilidade às políticas de compliance é reconhecer que toda pessoa, com ou sem deficiência, tem o direito de acessar informações, consumir produtos e participar da vida social em condições de igualdade. Esse movimento fortalece a responsabilidade social corporativa e conecta marcas a um propósito mais amplo: o de contribuir para uma sociedade mais justa.
O desafio vai além de obedecer leis. Ele está em traduzir compliance em cultura organizacional. Empresas que integram a acessibilidade em seus processos internos, treinamentos, comunicação e tomada de decisão criam ambientes mais diversos, colaborativos e resilientes.
No segundo dia do Link Festival, durante a palestra “Compliance inclusivo: acessibilidade como estratégia legal e ética”, Deborah Kelly Affonso, 5ª Promotora de Justiça de Direitos Humanos do MPSP, destacou que “muitas pessoas acham que essas leis são novas, mas datam de 1989 aqui no Brasil”. Ela lembrou que a legislação é clara: todo meio de comunicação deve ser acessível. Além disso, existe um decreto que torna a acessibilidade obrigatória, e as empresas precisam respeitar leis federais, estaduais e municipais, bem como as normas da ABNT, que também têm caráter obrigatório.
Complementou ainda trazendo casos práticos: grandes empresários que só passaram a olhar para a acessibilidade após fiscalizações reconheceram não fazer ideia de que poderiam incluir um novo nicho de mercado. Ele citou, por exemplo, uma grande rede de shoppings que, depois de se adequar, percebeu aumento no fluxo de visitantes e, consequentemente, nas vendas.
Esses relatos reforçam que compliance inclusivo não é apenas sobre cumprir normas: é sobre transformar a forma como as empresas enxergam o impacto social e econômico da acessibilidade.
A acessibilidade digital não pode mais ser tratada como um apêndice em estratégias de compliance. Ela é central, urgente e inegociável. O risco de não agir vai muito além de multas: compromete a reputação, a credibilidade e a relevância de qualquer organização.
Por outro lado, ao incorporar acessibilidade como estratégia legal e ética, empresas se posicionam não apenas em conformidade com a lei, mas também no lado certo da história. Criam valor para seus negócios e, sobretudo, para a sociedade. Esse é o verdadeiro sentido do compliance inclusivo: um compromisso que protege juridicamente, fortalece eticamente e transforma culturalmente.
*Ronaldo Tenório é CEO e cofundador da Hand Talk, uma das startups mais premiadas do Brasil, reconhecida pela ONU como o melhor aplicativo social do mundo. Ele foi eleito pelo MIT como um dos 35 jovens mais inovadores do planeta, destacou-se como um dos 30 jovens mais promissores do Brasil pela Forbes e foi nomeado Empreendedor Social mais promissor pela Folha de São Paulo.
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THAÍS BITTENCOURT JACINTO
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