Em um momento em que o Brasil enfrenta turbulências internas e internacionais da instabilidade econômica global às crises políticas domésticas, o Senado decidiu avançar com uma proposta que resgata o voto impresso, medida já considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
O movimento escancara uma tentativa deliberada de setores específicos do Congresso de impor uma agenda retrógrada, que em nada contribui para o fortalecimento democrático. Pelo contrário: representa um retrocesso evidente. O Brasil foi referência mundial ao adotar o voto eletrônico no final dos anos 1990, um sistema que reduziu drasticamente as fraudes e garantiu agilidade, transparência e confiabilidade ao processo eleitoral.
Como funcionava o voto impresso?
Antes da implantação das urnas eletrônicas, o processo de votação no Brasil era feito integralmente em papel. O eleitor recebia uma cédula impressa com os nomes e números dos candidatos, preenchia manualmente a escolha e depositava o voto em uma urna física de lona ou madeira, que ficava sob responsabilidade da mesa eleitoral. A apuração, feita de forma manual, era lenta, sujeita a erros e frequentemente marcada por fraudes, como substituição de cédulas, preenchimento incorreto ou desaparecimento de urnas. Foi justamente para superar essas falhas que o país adotou o sistema eletrônico, reduzindo drasticamente as possibilidades de manipulação e acelerando a contagem dos votos.
Ao insistir em retornar ao papel, parlamentares empurram o país para um caminho oneroso e ineficiente. A implantação de impressoras nas urnas, manutenção constante, logística e segurança para armazenar milhões de votos impressos significariam custos bilionários aos cofres públicos, recursos que poderiam ser melhor aplicados em áreas urgentes como saúde, educação ou infraestrutura.
De onde virá o recurso para essas mudanças?
Para o advogado eleitoral Wallyson Soares, além do retrocesso institucional, a proposta traz consigo uma séria ameaça às contas públicas: “O voto impresso não é apenas uma questão política, mas também orçamentária. Estamos falando de bilhões de reais que precisariam ser realocados do orçamento público para custear uma medida que não traz benefícios reais ao processo democrático”, afirma. “Na prática, isso significa sacrificar investimentos essenciais em áreas como saúde, educação e segurança para bancar uma pauta de retrocesso.”
Mais do que isso: a sinalização ao mundo é desastrosa. Em vez de reafirmar a imagem de um país que modernizou seu sistema eleitoral e se tornou exemplo para outras democracias, o Brasil passa a impressão de desconfiança nas próprias instituições e de um movimento de retrocesso, alimentado por disputas políticas e teorias de desinformação.
Mas afinal, o Senado pode fazer isso?
Segundo Wallyson Soares, mesmo com a tramitação no Congresso, a proposta esbarra em limites constitucionais já reconhecidos pelo Supremo Tribunal Federal:
“Tecnicamente, o Congresso tem competência para propor mudanças no sistema eleitoral, mas isso não significa que tudo seja permitido. O Supremo Tribunal Federal já declarou a inconstitucionalidade do voto impresso por entender que ele fere princípios como a segurança, a eficiência e a própria confiabilidade do processo”, explica. “Ou seja, ainda que o Senado aprove essa pauta, ela certamente enfrentará questionamentos jurídicos sérios e dificilmente passará pelo crivo do Judiciário.”
Num cenário de crise, ao invés de discutir pautas que projetem o país para o futuro, parte do Congresso escolhe olhar para trás, reforçando uma agenda que combina custo elevado, risco jurídico e fragilidade institucional. O voto impresso não é um avanço democrático: é um salto para trás em pleno século XXI.
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LETICIA SOARES GRAF
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