Paternidade atípica: o papel dos pais no desenvolvimento de crianças neurodivergentes

No mês dos pais, especialistas chamam atenção para a importância da figura paterna no processo de aceitação, intervenção precoce e evolução de filhos com transtornos do neurodesenvolvimento

JúLIA BOZZETTO
05/08/2025 21h33 - Atualizado há 6 horas

Paternidade atípica: o papel dos pais no desenvolvimento de crianças neurodivergentes
Arquivo Pessoal

Todos falam sobre maternidade atípica, mas pouco se discute sobre a paternidade atípica — especialmente quando o assunto é o impacto emocional do diagnóstico e a participação ativa no desenvolvimento de uma criança neurodivergente. No mês em que se celebra o Dia dos Pais, o debate ganha relevância e convida à reflexão sobre o lugar do homem nesse processo.

Para Silvia Kelly Bosi, neuropsicopedagoga, especialista em desenvolvimento infantil e CEO da clínica Potência, a figura paterna precisa ser reconhecida como parte essencial na intervenção precoce. “Ainda existe uma cultura que coloca o pai como coadjuvante nos cuidados, mas a verdade é que ele tem um papel estruturante tanto no aspecto emocional da criança quanto no suporte à família”, afirma.

Segundo a especialista, o impacto do diagnóstico de autismo, TDAH ou qualquer outro transtorno do neurodesenvolvimento muitas vezes atinge o pai de forma mais silenciosa — e por isso, mais perigosa. “O luto parental, embora vivido por ambos, costuma se manifestar de forma mais latente nos homens, que muitas vezes foram ensinados a não expressar vulnerabilidade. Isso pode levar ao distanciamento emocional justo no momento em que a criança mais precisa de acolhimento e estímulo”, explica.

Essa experiência é vivida de forma intensa pelo advogado Flávio Bosi, pai da Valentina, de 7 anos. Casado com Silvia, ele compartilha de forma aberta e sensível a jornada de descobertas, desafios e aprendizados como pai atípico. “Ser pai da Valentina é, todos os dias, um convite para enxergar o mundo com mais leveza, mais paciência e mais coragem. A nossa caminhada juntos é diferente do que eu imaginava lá atrás, quando sonhava em ser pai novamente. Mas é justamente nessa diferença que mora a beleza da nossa história”, conta. 

Ele recorda o impacto do primeiro momento em que ouviu a palavra “autismo” associada à filha. “Foi como se o chão abrisse. Não pelo diagnóstico em si, mas pelo medo do desconhecido. Eu me perguntava se seria capaz de ser o pai que ela precisava. Mas a Vavá nunca teve medo. Enquanto eu ainda tentava entender tudo, ela seguia sendo ela mesma — autêntica, única, intensa e sensível.”

Entre os marcos mais simbólicos de sua trajetória, Flávio destaca o dia em que foi chamado de “papai” pela primeira vez. “Depois de muito tempo de estímulos, repetições e apoio, ela disse ‘papai’ e veio um abraço. Foi simples, rápido, mas imenso. Um gesto que carregava meses de esforço, de espera e de construção de vínculo”, relembra. 

Ele também faz questão de ressaltar o papel fundamental de Silvia, não apenas como mãe e profissional da saúde, mas como pilar do processo. “Enquanto eu buscava entender, ela emergia nos estudos, enfrentava resistências e acolhia cada detalhe com uma força admirável. Aprendi com ela o que significa lutar com serenidade, agir com firmeza e acreditar com o coração inteiro.”

Para o casal, a intervenção precoce foi o divisor de águas na jornada da família. “Foi com ela que aprendemos a entender os sinais da Vavá, a respeitar seu tempo e a estimular seu desenvolvimento com afeto, ciência e estrutura”, diz Flávio.

A participação paterna, portanto, vai muito além do suporte logístico. Envolve escuta, vínculo e presença ativa. “Hoje sei que ser pai atípico é ser um aprendiz contínuo. É celebrar pequenas conquistas, reaprender o que é essencial e trocar expectativas por presença. A Valentina não precisa se encaixar em um padrão. Ela precisa ser respeitada, compreendida e acolhida em sua singularidade. E eu sigo aqui: para protegê-la, defendê-la e, acima de tudo, amá-la exatamente como ela é”, finaliza. 

Neste Dia dos Pais, o convite é claro: valorizar a presença masculina como um agente transformador na vida de crianças atípicas. Porque quando o pai participa, toda a estrutura ao redor da criança se fortalece.


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