O Genocídio Silencioso: a morte sistemática da população negra no Brasil

Maristela Gripp*

JULIA ESTEVAM
04/08/2025 11h43 - Atualizado há 8 horas

O Genocídio Silencioso: a morte sistemática da população negra no Brasil
Rodrigo Leal

A realidade brasileira tem uma programação habitual de violência contra a população negra. Em 4 de julho deste ano, Guilherme Dias Pereira, jovem negro de 26 anos, foi executado "por engano" com um tiro na nuca enquanto corria para pegar o ônibus após o trabalho. Casado há pouco mais de dois anos, trabalhador, evangélico, sem antecedentes criminais - nenhuma dessas características o protegeu da bala que ceifou sua vida.

O autor do disparo, um policial, alegou ter sofrido tentativa de assalto minutos antes e, ao ver um jovem negro correndo, assumiu tratar-se de um dos criminosos. Foi preso em flagrante, pagou fiança e deixou a delegacia pela porta da frente. Sua "punição"? Afastamento temporário das funções.

Este não é um caso isolado, mas parte de uma engrenagem maior de extermínio que opera sistematicamente no Brasil. Os números são aterrorizantes: segundo o Atlas da Violência 2024, uma pessoa negra é assassinada a cada 12 minutos no país. Pesquisa da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e do Senado Federal revelou que 56% dos brasileiros concordam que "a morte violenta de um jovem negro choca menos a sociedade do que a morte de um jovem branco". Mais alarmante ainda: a probabilidade de um jovem negro ser assassinado é 2,5 vezes maior que a de um jovem branco.

O Genocídio Mascarado: a análise de Abdias do Nascimento

Diante desses dados devastadores, torna-se fundamental compreender o fenômeno através da lente analítica de Abdias do Nascimento. Em sua obra seminal "O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado", o intelectual, artista e político pan-africanista (1914-2011) utiliza a definição de genocídio da ONU para demonstrar que o povo negro brasileiro é vítima de um genocídio sistemático e disfarçado.

Segundo Nascimento, esse extermínio não se manifesta apenas através da violência física direta, mas principalmente por meio de mecanismos institucionais, culturais e sociais que visam apagar a identidade, a cultura e a própria existência dos negros no país. O autor desnuda o racismo como estrutura fundante da sociedade brasileira, perpetuado por instituições estatais, sistema educacional, mídia e práticas sociais que sistematicamente marginalizam a população negra, negando-lhe acesso ao poder, educação de qualidade e representatividade.

O genocídio da população negra brasileira opera através de múltiplas dimensões: violência policial e encarceramento em massa; exclusão econômica e social sistemática; e morte simbólica, materializada na negação da identidade e cultura negras nos currículos escolares, espaços de poder e representação midiática.

O racismo estrutural brasileiro perpetua desigualdades profundas, limitando o acesso da população negra à educação, emprego, saúde e segurança. Transformar essa realidade exige a implementação urgente de ações afirmativas robustas, políticas de reparação histórica e reconhecimento efetivo do papel fundamental dos negros na construção do Brasil.

Enquanto jovens como Guilherme continuarem sendo executados nas ruas por "engano", enquanto uma pessoa negra for assassinada a cada 12 minutos, enquanto a morte de jovens negros chocar menos a sociedade, estaremos longe de uma democracia plena. A construção de uma sociedade verdadeiramente justa e inclusiva para todos os brasileiros, independentemente da cor, permanece como desafio urgente e inadiável.

O genocídio da população negra brasileira não é metáfora - é realidade documentada, quantificada e sistematizada. Reconhecer essa verdade é o primeiro passo para interrompê-lo. O segundo é agir, coletiva e incansavelmente, por justiça e igualdade racial no Brasil.

*Maristela dos Reis Sathler Gripp é doutora em Estudos da Linguísticos e professora do Centro Universitário Internacional Uninter.

 


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