Nos últimos anos, o mercado de arte digital movimentou bilhões de dólares globalmente, impulsionado pela ascensão dos NFTs (tokens não fungíveis) e plataformas de comercialização como OpenSea e Foundation. Porém, ao mesmo tempo em que a criptoarte ganhou notoriedade, os conflitos jurídicos sobre autoria, reprodução e violação de direitos autorais explodiram — inclusive no Brasil.
De acordo com o Relatório da WIPO (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) de 2024, mais de 2 mil disputas legais envolvendo NFTs e obras de arte digital foram registradas em 18 países, com destaque para questões de apropriação indevida, revenda sem autorização e ausência de contratos claros sobre cessão de direitos.
No Brasil, embora ainda não haja uma legislação específica para NFTs, a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) continua sendo a principal base legal para julgamento dessas disputas — muitas vezes adaptada para realidades digitais não previstas originalmente.
“O que temos hoje é um vácuo normativo. A comercialização de obras digitais com uso de blockchain criou uma falsa sensação de segurança jurídica, quando na verdade, a maioria das transações não garante os direitos morais ou patrimoniais do artista original”, explica a advogada e colecionadora de arte Dra. Marta Fadel.
Muitos compradores de arte digital ainda acreditam que adquirir um NFT significa obter todos os direitos sobre aquela obra, o que não é verdade. Em diversos casos recentes, obras digitalizadas e tokenizadas foram vendidas por terceiros sem o consentimento ou sequer o conhecimento do autor original.
A falta de contratos específicos ou a ausência de registro formal da obra em órgãos como o Escritório de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional ampliam o risco dessas operações.
“A blockchain garante autenticidade de um token, não necessariamente de quem detém os direitos autorais. São camadas jurídicas diferentes. O autor pode nunca ter dado permissão para aquele uso, mesmo que a tecnologia afirme que há um 'dono digital' da imagem”, afirma Dra. Marta Fadel.
Ela aponta que o direito moral do autor, previsto na legislação brasileira, permanece inalienável: o artista tem o direito de ser reconhecido e de ter sua obra protegida contra distorções, ainda que ela esteja circulando no metaverso ou em carteiras digitais.
A ausência de padrões jurídicos mínimos para contratos NFT é outro ponto de tensão. Muitos marketplaces não exigem declarações formais de autoria ou licenciamento prévio, o que cria uma “zona cinzenta” para colecionadores e artistas.
“Hoje, artistas estão vendo seus portfólios sendo vendidos por perfis anônimos. E, quando tentam reivindicar a autoria, encontram dificuldade para identificar os vendedores ou acionar plataformas com sede fora do Brasil”, alerta a especialista.
Em um dos casos emblemáticos de 2024, uma artista visual brasileira teve uma de suas obras vendida como NFT no exterior sem sua autorização. O processo judicial ainda tramita no Brasil, com pedido de cooperação internacional via MPF.
A advogada Marta Sahione Fadel defende a criação de marcos regulatórios específicos para arte digital, que respeitem os princípios do direito autoral brasileiro e as novas dinâmicas do mercado.
Ela também orienta artistas e compradores a registrar formalmente suas obras, mesmo que digitais, firmar contratos claros com cláusulas de uso, cessão e remuneração, evitar transações em plataformas que não verifiquem a autoria e acompanhar os projetos de lei sobre ativos digitais em tramitação no Congresso.
“A arte digital é legítima e inovadora, mas precisa de segurança jurídica para florescer. Sem isso, teremos um mercado rico em tecnologia e pobre em direitos”, conclui.
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Andreia Souza Pereira
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