O uso de cannabis medicinal na Medicina Veterinária deixou de ser tabu para se tornar um tema científico em franca expansão. Estudos internacionais e experiências clínicas no Brasil demonstram benefícios significativos no tratamento de doenças crônicas, dor neuropática, ansiedade, epilepsia e inflamações persistentes.
Como Médico-Veterinário, vejo esse avanço como uma oportunidade para integrar ciência, empatia e medicina personalizada. O CBD (canabidiol), principal composto terapêutico da planta, age de forma segura e não psicoativa — diferentemente do THC (tetrahidrocanabinol), que pode ser tóxico para cães e gatos.
O desafio atual é transformar esse potencial em prática segura, com acompanhamento técnico e respaldo legal.
Animais e humanos compartilham o Sistema Endocanabinoide, responsável por regular dor, apetite, sono, imunidade e humor.
O CBD interage com os receptores CB1 (sistema nervoso central) e CB2 (sistema imunológico), ajudando a restaurar o equilíbrio fisiológico — sem causar euforia ou dependência.
Pesquisas publicadas em revistas científicas como Frontiers in Veterinary Science e Journal of the American Veterinary Medical Association mostram que o canabidiol tem efeitos neuroprotetores, anti-inflamatórios e ansiolíticos, além de reduzir convulsões em cães epilépticos e melhorar a mobilidade de animais com osteoartrite.
Estudo da Cornell University (2018) revelou que cães tratados com CBD apresentaram melhora de até 83% na dor e mobilidade em apenas 30 dias.
Em estudos controlados, cães que receberam CBD apresentaram redução de até 89% na frequência das crises epilépticas — especialmente quando o produto foi administrado com acompanhamento veterinário e formulação certificada.
Além de aliviar a dor, o CBD melhora a qualidade do sono, reduz a rigidez articular e permite diminuir o uso de anti-inflamatórios tradicionais, que frequentemente causam efeitos colaterais hepáticos e gástricos.
O canabidiol modula neurotransmissores ligados à serotonina, auxiliando em quadros de ansiedade de separação, medo de ruídos e fobias — problemas cada vez mais comuns em pets urbanos.
Nos gatos, pesquisas indicam benefícios no controle da dor neuropática e da inapetência. No entanto, a metabolização felina é distinta, exigindo monitoramento rigoroso de dose e resposta.
O uso de cannabis medicinal em animais ainda carece de regulamentação específica pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), mas o debate técnico já é pauta ativa em entidades como o Ministério da Saúde, Anvisa e universidades públicas.
Hoje, há três formas seguras de acesso a produtos à base de CBD no Brasil:
Importação autorizada pela Anvisa, mediante prescrição médica.
Aquisição por meio de associações brasileiras de cannabis medicinal, que produzem e distribuem produtos sob controle sanitário e mediante prescrição profissional.
Farmácias de manipulação habilitadas, que trabalham com extratos importados e certificados.
Essas associações e instituições, regulamentadas e fiscalizadas, têm papel essencial na democratização do acesso e no controle de qualidade.
É fundamental reforçar que a prescrição veterinária é indispensável. O uso indiscriminado de produtos sem orientação técnica pode causar intoxicações graves, especialmente por THC.
A cannabis medicinal não deve ser vista como “alternativa milagrosa”, mas como uma ferramenta terapêutica complementar, usada dentro de protocolos clínicos individualizados.
A atuação do Médico-Veterinário é determinante para garantir segurança e resultados positivos.
Como profissional, minha conduta inclui:
Avaliação clínica completa e exames prévios.
Escolha de produtos certificados com laudo laboratorial.
Ajuste da dosagem conforme resposta terapêutica.
Monitoramento hepático e renal.
Comunicação contínua com o tutor.
Essa abordagem garante o uso racional e ético da cannabis, respeitando os princípios da medicina baseada em evidências e o bem-estar animal.
O uso da cannabis na Medicina Veterinária representa um marco no avanço ético da profissão. A ciência já não discute “se funciona”, mas como aplicar com segurança e responsabilidade.
O caminho é a regulamentação, o estudo contínuo e o diálogo entre tutores, profissionais e instituições.
Tratar um pet com cannabis medicinal não é uma questão de moda — é uma decisão clínica baseada em empatia, ciência e compromisso com a vida.
CFMV – Pareceres técnicos sobre fitoterápicos e canabinoides
Frontiers in Veterinary Science – Cannabidiol in Veterinary Medicine (2023)
Journal of the American Veterinary Medical Association (2022)
Cornell University College of Veterinary Medicine – Estudo sobre osteoartrite canina e CBD (2018)
Caes & Gatos Pet News – Uso de Cannabis na Medicina Veterinária Avança (2025)
Matéria relacionada – Dor Crônica em Pets: Como Identificar e Tratar (link interno sugerido)
Matéria relacionada – Ansiedade e Estresse em Cães e Gatos: O Que Seu Pet Está Tentando Dizer (link interno sugerido)
O futuro da Medicina Veterinária é integrativo, científico e empático.
A cannabis medicinal, quando usada com respaldo técnico, pode devolver mobilidade, aliviar dores, reduzir convulsões e melhorar a qualidade de vida dos animais — e, por extensão, das famílias que os amam.
A ciência caminha para uma medicina veterinária mais compassiva e personalizada, onde cuidar do corpo é também cuidar da mente e da dignidade do animal.
Dr. Marcelo Müller é Médico-Veterinário com mestrado em Pesquisa Clínica, especializado em clínica médica e cirúrgica de pequenos animais, bem-estar animal e atendimento veterinário domiciliar. Atua na promoção de saúde preventiva e integrativa, com foco no diagnóstico precoce, respeito à senciência animal e fortalecimento do vínculo entre pets e tutores.
Autor do livro “Meu Pet… Meu Mundo…” e defensor da medicina veterinária baseada em evidências e ética científica.
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PRISCILA GONZALEZ NAVIA PIRES DA SILVA
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