Soberania de dados é estratégica e o Brasil não pode ignorar

PEDRO SENGER
09/09/2025 09h35 - Atualizado há 3 horas

Soberania de dados é estratégica e o Brasil não pode ignorar
Divulgação

Durante muitos anos, falar em soberania de dados soava como um debate distante, quase acadêmico. Afinal, as grandes provedoras globais sempre entregaram serviços de altíssima disponibilidade e resiliência. O que poderia dar errado? Até recentemente, a maioria dos executivos de tecnologia responderia: nada.

Entretanto, o cenário mudou. Hoje já presenciamos casos concretos de empresas relevantes no mundo inteiro que tiveram seus serviços interrompidos, não por falhas técnicas, mas por sanções políticas e decisões jurídicas além de suas fronteiras. Um exemplo recente foi o de uma gigante indiana de combustíveis que, mesmo sem relação direta com a União Europeia, teve seus serviços em nuvem (Microsoft) paralisados devido a sanções ligadas a Rússia. Como resultado, foram dias de operação comprometida, prejuízos financeiros e abalo de confiança.

Esse episódio traz uma reflexão que deve ecoar no Brasil: até que ponto estamos preparados para lidar com interrupções causadas por fatores que não controlamos? A dependência quase exclusiva de big techs internacionais cria uma vulnerabilidade que poucas empresas mensuraram em seus planos de risco.

Leis como o Cloud Act, nos Estados Unidos, o E-Evidence, na Europa, e mais recentemente a Lei Magnitsky, ampliam ainda mais esse desafio. Esta última, criada originalmente para punir corrupção e violações de direitos humanos, passou a ser usada também como instrumento de sanções econômicas e tecnológicas. Na prática, isso significa que uma empresa brasileira pode ter seus serviços suspensos mesmo sem ser alvo direto, apenas por estar conectada a ecossistemas ou parceiros comerciais em países sob sanção.

Ou seja, mesmo uma companhia que cumpre integralmente a LGPD pode ser impactada por decisões que nada têm a ver com a realidade nacional. E a pergunta que precisa ser feita é simples: quantas empresas brasileiras resistiriam a uma semana com sistemas críticos fora do ar?

É por isso que a discussão sobre soberania de dados precisa deixar de ser periférica e se tornar parte central da estratégia corporativa. Não se trata de nacionalismo tecnológico, mas de gestão de risco e continuidade de negócios. Empresas que concentram toda a sua infraestrutura em um único provedor global estão mais expostas a bloqueios, suspensões e vulnerabilidades externas.

A boa notícia é que existem alternativas. Modelos híbridos de gestão da informação, que combinam nuvem privada no Brasil, soluções locais e ferramentas avançadas de backup e disaster recovery, já estão disponíveis e acessíveis. Essa diversificação é o caminho mais seguro para mitigar riscos e garantir resiliência, independentemente das tensões geopolíticas.

A LGPD foi um passo fundamental para amadurecer o debate sobre privacidade e proteção no Brasil. Mas, diante do contexto internacional, precisamos ampliar a visão. Proteger dados hoje não é apenas impedir vazamentos ou ataques cibernéticos; é também garantir independência e continuidade frente a forças externas.

O Brasil é reconhecido por manter boas relações diplomáticas com a maioria dos países. Mas no mundo conectado em que vivemos, basta uma decisão unilateral em outro território para afetar empresas que não têm relação direta com o conflito.

No fim do dia, soberania digital significa resiliência. E o que vai separar as empresas que conseguem seguir operando em meio às turbulências daquelas que ficam vulneráveis é a capacidade de se antecipar, diversificar e proteger suas operações contra o imprevisível.

 

Erik de Lopes Morais, COO da Penso Tecnologia, empresa especializada em soluções gerenciadas de infraestrutura e proteção de dados.


 

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