Por que mentimos? Os limites entre a autoilusão e a fraude
Especialista alerta para os impactos de viver em constante dissimulação — e os caminhos para retomar a autenticidade
Débora Luz | Literare Books
29/04/2025 09h30 - Atualizado há 20 horas
Literare Books
O que acontece quando a mentira deixa de ser uma escapatória pontual e passa a reger a vida de alguém? Essas questões, que atravessam tanto a psicologia quanto a ética, ganham destaque no livro de Carlos Eduardo Simões, “As mentiras que contam para você – O poder da autoilusão”, publicado pela Literare Books International. A obra parte de um ponto sensível, porém universal: a capacidade que temos de aceitar inverdades – contadas por outros ou, pior ainda, por nós mesmos – como verdades absolutas. Segundo o autor, “muitas vezes, não é a mentira do outro que mais nos machuca, mas a que repetimos internamente até se tornar um muro invisível que nos impede de avançar”. O livro é um convite à reflexão. Baseado em pesquisas, estudos e vivências pessoais, Carlos Eduardo mostra como essas falsas verdades moldam decisões, travam carreiras e minam relações. A mentira, nesse contexto, é mais do que um simples desvio ético – ela pode ser um mecanismo inconsciente de proteção, uma autoilusão. Mas há um limite. E quando ele é ultrapassado, entramos em outro território: o da compulsão, da falsidade ideológica, da mitomania – nome clínico dado ao comportamento compulsivo de mentir. Nesses casos, a mentira passa a ser utilizada como instrumento de manipulação social, e os danos extrapolam o universo do indivíduo. Mentir pode virar doença? A psicologia define a mitomania como uma condição em que a pessoa mente com frequência e sem necessidade aparente. Ao contrário da mentira “comum”, que geralmente tem um objetivo claro (evitar punições, agradar, conseguir vantagem), o mitômano constrói realidades paralelas, muitas vezes acreditando nas próprias narrativas. Esse descolamento da realidade pode trazer sérias consequências – tanto emocionais quanto sociais – e, em casos extremos, envolver até crimes. Um teatro de 40 anos Exemplo emblemático dessa fronteira entre mentira e delírio socialmente estruturado é o do juiz aposentado José Eduardo Franco dos Reis, revelado recentemente. Por mais de quatro décadas, ele viveu sob a identidade fictícia de Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield, alegando ser descendente de nobres britânicos. Com essa falsa identidade, ele ingressou na USP, foi aprovado em concurso público e atuou como juiz no Tribunal de Justiça de São Paulo. Tudo começou com um RG falso em 1980 e só veio à tona em 2024, quando tentou tirar segunda via do documento. A farsa caiu após análise das impressões digitais, revelando que os dois registros – o verdadeiro e o fictício – pertenciam à mesma pessoa. Investigações confirmaram que não há nenhum registro do nome britânico em sistemas oficiais do Reino Unido. Carlos Eduardo comenta: “O mais impressionante nesses casos não é apenas a construção da mentira, mas o quanto o sistema – social, institucional, emocional – pode se adaptar à farsa. A mentira sustentada por anos deixa de ser apenas uma invenção: ela se institucionaliza.” Entre a autoilusão e a fraude O livro de Carlos Eduardo Simões não fala de fraudes judiciais ou escândalos criminais, mas nos ajuda a entender como pequenas distorções da realidade – muitas vezes inocentes ou bem-intencionadas – podem virar verdadeiros sistemas internos de autossabotagem. E, em escala maior, podem se transformar em mentiras com impacto coletivo. “Mentimos por medo, por vergonha, por querer aceitação. Mas também mentimos porque não fomos ensinados a lidar com a verdade de forma madura”, afirma o autor. No fim, a obra nos convida a um exercício difícil, porém libertador: rever a história que contamos para nós mesmos e identificar quais dessas narrativas são apenas véus sobre a realidade. Afinal, como Carlos Eduardo resume, “enxergar a verdade pode doer. Mas viver uma mentira dói mais – e por muito mais tempo”. Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
DÉBORA SANTANA LUZ
[email protected]