Abril Azul e Mobilidade Urbana

Por Flávia Nascimento, especialista em transportes do Mova-se Fórum de Mobilidade

KASANE COMUNICAÇÃO
28/04/2025 15h09 - Atualizado há 1 mês

Abril Azul e Mobilidade Urbana
Divulgação - Arquivo Pessoal

Abril Azul é um convite à reflexão. O mês dedicado à conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) nos lembra que, apesar dos avanços, ainda estamos longe de construir uma cidade verdadeiramente inclusiva. Em Goiânia, por exemplo, quando falamos em mobilidade urbana para pessoas autistas, ainda estamos apenas engatinhando. A infraestrutura urbana tem priorizado historicamente as adaptações físicas — como rampas e pisos táteis — e negligenciado aspectos sensoriais e cognitivos essenciais para quem vive com o autismo. Além disso, a própria diversidade dentro do espectro exige ainda mais cuidado, pois cada nível de suporte exige necessidades distintas de apoio, e a cidade precisa estar preparada para atender todas essas realidades. 

A experiência urbana, para muitas pessoas autistas, é cercada de obstáculos invisíveis, especialmente para quem apresenta hipersensibilidade sensorial. O transporte público, com sua poluição sonora constante, excesso de estímulos visuais e sinalizações confusas, pode provocar crises sensoriais. Mesmo adultos autistas que conseguem dirigir e circular pela cidade com independência enfrentam desafios diários: o trânsito imprevisível, a falta de sinalizações claras e a ausência de comunicação acessível em situações de emergência são barreiras reais, ainda que invisíveis. E o preconceito também pesa, já que em uma abordagem policial, uma reação atípica pode ser interpretada como desobediência, colocando essas pessoas em risco desnecessário. A autonomia, nesses casos, é minada por fatores que poderiam ser evitados com políticas públicas e formação adequada de agentes. 

Soma-se a isso que nossa infraestrutura urbana continua sendo pensada apenas para deficiências visíveis. Por essa razão, em vez de ambientes caóticos e mal sinalizados, poderíamos ter espaços mais tranquilos, organizados, com cores neutras, linguagem simples, e até áreas de descanso sensorial — como já existem em alguns aeroportos. Nesse sentido, iniciativas como as de Campinas (SP) – com cartilhas orientativas – e Natal (RN) – com a ação “Busão da Inclusão” –, que promovem campanhas de conscientização dentro do transporte coletivo, são exemplos positivos que mostram como é possível transformar a realidade com informação e empatia. Goiânia, por outro lado, desconheço se temos políticas públicas voltada especificamente para autistas, mas isso pode — e deve — mudar. 

Hoje, com a cidade está sob nova gestão, é hora de escutar as famílias atípicas, incluir o TEA no Plano Diretor, treinar os profissionais da mobilidade urbana, repensar a comunicação nos terminais e incluir legislações que garantam direitos. Precisamos de mais empatia, escuta ativa e compromisso real com a inclusão. Uma cidade pensada para as necessidades sensoriais e cognitivas das pessoas autistas é, no fim das contas, uma cidade melhor para todos — mais simples, mais acolhedora, mais humana. Abril Azul nos lembra que o invisível também precisa ser visto e respeitado. 

Flávia Nascimento é engenheira civil, especialista em transportes e integrante do Mova-se Fórum de Mobilidade 


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CAROLINA OLIVEIRA DE ASSIS
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