A aprovação recente na Câmara da PEC 3/2021, conhecida como PEC da Blindagem, abriu espaço para um debate central sobre o papel do Parlamento, a liberdade de expressão parlamentar e o dever de transparência no uso institucional do poder. Com voto secreto reinstaurado para autorizar processos criminais contra deputados e senadores, a proposta levanta questões urgentes: até que ponto a imunidade protege mandato político legítimo — e quando ela pode se transformar em obstáculo à responsabilização?
A proposta exige autorização prévia da Câmara ou do Senado para processar criminalmente deputados e senadores, mesmo em casos de prisão em flagrante por crime inafiançável. Agência Brasil+2Portal da Câmara dos Deputados+2
O voto secreto, reincluído por destaque, será aplicado para essas autorizações — o que reduz a visibilidade do posicionamento individual dos parlamentares. Agência Brasil+2JOTA Jornalismo+2
A PEC também amplia prerrogativas parlamentares, reforçando a necessidade de quóruns qualificados para mudanças constitucionais nesse campo. Senado Federal+1
A imunidade parlamentar está prevista no art. 53 da Constituição Federal, garantindo que deputados e senadores sejam “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. JOTA Jornalismo+1
Essa cláusula foi pensada para proteger o exercício do mandato contra pressões políticas ou judiciais indevidas, especialmente em regimes autoritários. Entretanto, há limites reconhecidos no ordenamento jurídico, especialmente quando a manifestação ultrapassa o âmbito político ou quando se confunde com atos pessoais ou de autopromoção.
A reinstauração do voto secreto na PEC traz consequências importantes:
Reduz a capacidade do público de fiscalizar quem votou a favor ou contra em temas que autorizam processos criminais contra parlamentares. Agência Brasil+1
Pode gerar menor responsabilização individual dos parlamentares, uma vez que o eleitor não saberá como seu representante se posicionou.
Afeta o princípio da publicidade, previsto na Constituição, que exige que atos públicos sejam transparentes e acessíveis à sociedade.
Com as redes sociais e plataformas digitais, muitos parlamentares assumem papel de comunicação direta com seguidores. Esse mandato digital permite interação, prestação de contas e divulgação de ideias.
Mas esse mesmo espaço pode ser usado como palco de ego-casting — conteúdo personalizado, autopromoção ou discursos que ultrapassam o debate político, sem nexo funcional claro com as atribuições constitucionais do mandato.
Se a imunidade for aplicada sem critérios definidos para distinguir discurso institucional do discurso pessoal, corre-se o risco de ampliar a impunidade sob o pretexto de prerrogativa parlamentar.
A tramitação da PEC 3/2021 altera artigos como o 53 da Constituição, relacionados às prerrogativas parlamentares. Portal da Câmara dos Deputados+1
Decisões recentes do STJ e menções de casos legislativos tratam do nexo funcional — quando manifestação de um parlamentare se relaciona com o exercício do mandato, para que imunidade se aplique. (Ainda que o STF estabeleça critérios semelhantes, o texto da PEC precisa prever claramente esses limites.)
A PEC da Blindagem contém dispositivos que podem fortalecer o mandato parlamentar sob a lógica da proteção institucional. Contudo, há riscos reais:
perda de transparência e controle social com voto secreto;
ampliação de prerrogativas sem critérios claros para distinção entre discurso institucional e discurso pessoal;
possibilidade de uso da imunidade para proteger parlamentares em casos que ultrapassam o exercício legítimo do mandato.
Para mitigar esses riscos, são necessários mecanismos claros:
definição normativa do que constitui manifestação ligada ao mandato;
exigência de publicação clara de autoria de discursos institucionais;
regras regimentais que distingam perfil institucional de perfil pessoal;
fiscalização ativa por órgãos constitucionais de controle;
Leandro Velloso — Docente de Direito (UNESA) | Pesquisador em Direitos Fundamentais (FDV/ES) | Pós-graduado pela PUC/SP | Autor de 16 livros | Advogado e gestor público com mais de 25 anos de atuação.
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PRISCILA GONZALEZ NAVIA PIRES DA SILVA
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