Indústria corre para modernizar, mas tropeça nos próprios erros

Antes de investir em alta tecnologia, fábricas brasileiras redescobrem a importância de mapear seus gargalos e organizar a gestão

Milena Santos
20/05/2025 17h03 - Atualizado há 4 horas

Indústria corre para modernizar, mas tropeça nos próprios erros
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O Dia da Indústria, celebrado em 25 de maio, reacende um velho debate sobre a produtividade do setor. Apesar de avanços pontuais em inovação, a indústria brasileira ainda convive com gargalos que limitam sua eficiência. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram que a produtividade do setor está em queda há mais de uma década. Essa trajetória sugere que o problema não está apenas na escassez de investimentos, mas também na forma como as fábricas lidam com seus próprios processos.

 

A chave, apontam consultores e gestores públicos, está em algo mais básico do que robôs ou sensores inteligentes — o diagnóstico interno. Sem saber onde estão os desperdícios, gargalos e falhas operacionais, qualquer investimento corre o risco de virar uma solução cara para um problema mal identificado.

Essa é a tese defendida por Vânia Batista, fundadora do Gemba Group, empresa especializada em gestão enxuta e melhoria contínua. "Uma indústria precisa atuar com gestão e operação enxuta, e isso começa capacitando sua força de trabalho. São eles que fazem o resultado acontecer. Altos índices de retrabalho, falta de métodos e ferramentas para analisar, controlar e potencializar a produtividade, e desperdícios em processos e materiais derrubam os resultados de eficiência operacional", afirma.

O raciocínio encontra eco na análise de Flávio Numata Junior, gestor da Fundep (Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que atua com programas de fomento à inovação industrial. "Sem processos bem definidos, a tecnologia apenas automatiza o caos. Às vezes, a empresa tenta implementar uma solução tecnológica sem ter nem controle básico de produção, o que não tem aderência à realidade", afirma. Segundo ele, um processo bem gerido pode ser feito até "na ponta do lápis", quando se tem um método.

A abordagem tem ganhado adesão entre pequenas e médias indústrias, que veem na organização dos processos um caminho mais acessível para crescer. O modelo adotado pelo Gemba Group, por exemplo, prevê quatro fases que incluem diagnóstico inicial, implantação da gestão enxuta, capacitação das equipes e, por fim, adoção de tecnologias como automação e robotização. Essa estrutura, segundo Vânia, evita que decisões sejam tomadas com base apenas no instinto ou sob pressão por modernização. "A empresa precisa diagnosticar como e onde está perdendo performance. Com essas informações, parte para a implantação do sistema de gestão e operação enxuta, capacita seus trabalhadores com foco em melhoria contínua, e só depois está preparada para embarcar tecnologias", explica.

Diagnóstico e maturidade digital: medir para evoluir

Mais do que identificar falhas pontuais ou desperdícios no chão de fábrica, o diagnóstico industrial tem ganhado protagonismo como ferramenta estruturante para orientar decisões estratégicas. Antes de qualquer movimento rumo à digitalização, a capacidade de entender com precisão os próprios processos se mostra essencial para evitar soluções caras para problemas mal definidos.

É por isso que, cada vez mais, ferramentas de diagnóstico vêm sendo aplicadas como ponto de partida para qualquer estratégia de transformação. Entre elas, destaca-se o teste de maturidade digital, criado pela Fundep e utilizado em projetos com indústrias de diversos portes.

Desenvolvido no âmbito do programa federal Mobilidade Verde e Inovação (Mover) linha IV – Ferramentarias, dentro da iniciativa Conecta Mais, o teste foi adaptado a partir da metodologia do Instituto Fraunhofer, referência em Indústria 4.0 na Europa. O objetivo é verificar o grau de preparo de uma empresa para evoluir em sua jornada digital e produtiva. "A aplicação permite entender o que a empresa deseja, o que de fato pode executar e como pode evoluir. O teste não serve apenas para avaliar, mas também para orientar a jornada de melhoria", explica Flávio Numata Junior, que atua pela Fundep no Programa Mover linha IV – Ferramentarias.

Segundo ele, o teste tem três funções centrais — alinhar expectativas, indicar prioridades de intervenção e medir a evolução após a implementação de soluções. Em um cenário em que o Brasil ainda se encontra majoritariamente nos níveis iniciais de maturidade digital, o teste se torna uma ferramenta essencial para orientar avanços realistas. É aplicado no início e ao fim dos projetos. "Em muitos casos, a indústria deseja implantar sensores inteligentes ou automação sofisticada, mas ainda opera com controles manuais e sem dados estruturados. O teste ajuda a evitar equívocos e direcionar melhor os recursos", afirma.

Mais do que um checklist tecnológico, a ferramenta também considera aspectos de gestão, estrutura de pessoas, processos e cultura organizacional. "Há uma resistência natural a mostrar fragilidades internas. Mas o diagnóstico, quando conduzido com critério e confidencialidade, abre espaço para que o empresário enxergue com clareza onde está e o que precisa mudar", afirma Numata. Para ele, reconhecer o ponto de partida é o que permite definir um caminho realista de evolução industrial.

Tratado da Produtividade: solução estruturada com subsídio

O diagnóstico também estrutura outras iniciativas voltadas ao aumento da produtividade industrial. Uma delas é o Tratado da Produtividade, programa conduzido pelo Gemba Group, que parte da análise técnica dos processos para transformar mapeamento em ações práticas de melhoria. Em muitos casos, o Gemba atua como elo entre a empresa e instituições de fomento, como a Fundep, com quem mantém credenciamento para execução de projetos subsidiados.

O processo começa com um diagnóstico detalhado. A partir dele, a empresa define o que deseja implementar e, com apoio do Gemba, submete o plano à Fundep para viabilizar o acesso aos recursos necessários. "Nosso trabalho é ajudar a empresa a organizar suas prioridades, identificar as melhorias viáveis e acessar a verba sem que precise tirar do próprio bolso", explica Vânia Batista, fundadora do Gemba Group.

O Tratado opera em dois formatos. Um deles é voltado para a capacitação via educação a distância, com acesso a mais de 70 cursos voltados à qualificação de trabalhadores da indústria e lideranças operacionais na plataforma de capacitação industrial Gemba Ensina. O outro envolve projetos personalizados de gestão e operação enxuta, com diagnóstico técnico e implantação de soluções sob medida. Nessa frente, o Gemba atua como consultoria credenciada junto a instituições de fomento, como a Fundep, para viabilizar o acesso a subsídios.

"Muitas empresas querem melhorar, mas não sabem por onde começar. O Tratado da Produtividade transforma esse desejo em ação concreta, com impacto direto na eficiência e nos resultados financeiros das indústrias", afirma Vânia. Segundo ela, mesmo empresas com pouca estrutura podem iniciar a transformação desde que recebam orientação prática e recursos adequados.

Flávio Numata, da Fundep, reforça que programas como esse são fundamentais para tornar viável a modernização das pequenas e médias indústrias. Segundo ele, é comum que as empresas priorizem soluções técnicas imediatas, como aquisição de equipamentos, e deixem em segundo plano a estruturação de processos e a formação de equipes. "Os ganhos mais consistentes aparecem quando a empresa reorganiza seus processos. O salto real acontece quando se aprende a operar melhor com o que já se tem", afirma.

 

Serviço

Empresas interessadas em saber mais sobre o Tratado de Produtividade podem acessar o site www.tratadodaprodutividade.com.br. Já as informações sobre o Programa Mover linha IV – Ferramentarias da Fundep estão disponíveis em https://mover.fundep.ufmg.br/linha4/ 


 

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MILENA VITÓRIA PEREIRA DOS SANTOS
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