“Lâmpada” acende caminhos para o mercado plant-based no Brasil
Projeto Lâmpada, conduzido pelo GFI Brasil, ouviu 40 especialistas e apontou caminhos práticos para o avanço do setor plant-based, com foco em preço, sabor, regulamentação e infraestrutura
ELIZABETH MATIAS
25/04/2025 15h24 - Atualizado há 7 horas
GFI/Blog
Líder global na produção de alimentos como soja, milho, carne bovina e frango, o Brasil tem potencial para se tornar referência, também, em proteínas alternativas nos próximos anos. Com uma população global que deve chegar a 9,7 bilhões de pessoas em 2050 e a intensificação da crise climática que afeta a produção de alimentos, será fundamental desenvolver uma cadeia produtiva resiliente e sustentável, capaz de gerar riquezas para o país, ao mesmo tempo em que diminui os impactos ambientais da indústria alimentícia. O país reúne condições únicas para liderar esse processo: biodiversidade, ampla expertise agrícola, capacidade industrial e um ecossistema de pesquisa em alimentos em expansão. Em pouco mais de seis anos, o mercado de carnes vegetais ultrapassou R$1,1 bilhão em vendas no varejo, enquanto o de leites vegetais atingiu R$700 milhões, em 2024, segundo dados da Euromonitor. Embora o crescimento seja muito próximo ao registrado em 2023, o país pode sonhar com passos mais largos. Nesse contexto, projetos como o Lâmpada, do GFI Brasil, tornam-se instrumentos estratégicos para destravar barreiras, direcionar a produção e alinhar o setor nacional às tendências globais de mercado. A partir de entrevistas com 40 especialistas da indústria, academia e setor público, o GFI mapeou 48 gargalos ao longo da cadeia de valor de alimentos vegetais análogos à carne, em campos como ingredientes, produção, pesquisa e desenvolvimento (P&D), distribuição e produto. O objetivo, segundo os organizadores, foi “acender a luz do quarto escuro” e orientar os próximos passos da cadeia produtiva. Esse trabalho resultou em um roteiro de ação com sugestões que dialogam com o setor acadêmico, produtivo e regulatório, tendo como base a escuta ativa de quem está na linha de frente. Conheça os principais desafios e soluções mapeados pelo Lâmpada Um dos principais focos está na redução de custos. A maior parte dos insumos usados na fabricação de proteínas vegetais análogas à carne — como concentrados e isolados proteicos — ainda é importada, o que torna o setor vulnerável à flutuação cambial e a problemas logísticos internacionais. Entre as propostas, o estudo sugere o estímulo à produção nacional de ingredientes estratégicos, reduzindo a dependência de insumos importados e a exposição ao câmbio. Isso pode ser feito por meio de políticas públicas que incentivem a pesquisa agrícola voltada para culturas com alto teor proteico, adaptadas ao clima e solo brasileiros. Além disso, o fortalecimento de cooperativas e o apoio a produtores locais podem gerar uma cadeia de abastecimento mais robusta, eficiente e resiliente. Com o fomento adequado, o Brasil poderia ampliar as fontes vegetais de proteína (como feijão e espécies nativas) com potencial de uso industrial e boa aceitação sensorial. Outra frente importante é o avanço tecnológico. A promoção de investimentos em equipamentos e processos — como extrusoras úmidas e outras tecnologias emergentes — é vista como estratégica para aprimorar textura e estabilidade dos produtos durante o preparo. O estudo recomenda a criação de polos de inovação em alimentos, com laboratórios compartilhados e acesso facilitado a tecnologias de ponta, sobretudo para pequenas e médias empresas que enfrentam barreiras de entrada e de ganho de escala mais significativas. Na área de regulamentação, a proposta é trabalhar pela construção de um marco regulatório específico para produtos plant-based, que garanta a segurança desses alimentos e a previsibilidade jurídica necessária para o setor se desenvolver. O GFI defende a harmonização com normas internacionais, o que facilitaria a exportação de produtos brasileiros e ampliaria o alcance comercial do setor. Também sugerem a criação de um selo específico, validado por agências reguladoras, que possa atestar a conformidade dos produtos com critérios de qualidade, origem e rastreabilidade. De acordo com Bruno Filgueira, analista do GFI Brasil e responsável pelo estudo, a organização vem trabalhando também no Congresso Nacional por uma maior equidade tributária em relação às proteínas de origem animal. O roteiro ainda aponta a necessidade de reorganizar a logística. Diante da exigência de cadeias refrigeradas para o transporte e armazenamento dos produtos, a recomendação é o incentivo a parcerias logísticas entre empresas — inclusive com outras categorias de alimentos congelados — para diluição de custos. O apoio a startups de distribuição e a modernização de centros de armazenagem também são vistos como caminhos promissores. Outro ponto apontado está relacionado às embalagens. “O projeto mostra também que, como ocorre com categorias emergentes, ainda há incerteza sobre qual tipo de embalagem é mais eficiente e adequada para os produtos plant-based. Essa indefinição faz com que as empresas testem diferentes formatos, o que eleva os custos operacionais. Nossa sugestão, nesse caso, é que as indústrias priorizem formatos mais simples e economicamente viáveis, alinhados ao perfil do consumidor e às exigências do varejo, a fim de reduzir o impacto da embalagem no custo final do produto”, diz Filgueira. No relacionamento com o varejo, o projeto destaca a importância de profissionais capacitados das indústrias atuarem diretamente na gestão da categoria junto aos supermercados. Em um cenário em que varejistas lidam com centenas de SKUs (Stock Keeping Unit - Unidade de Manutenção de Estoque) simultaneamente, é essencial que a indústria atue de forma proativa para apoiar o varejo a nomear, precificar, posicionar e ativar os produtos plant-based de forma adequada. “Muitas empresas simplesmente inserem seus produtos nas gôndolas sem fornecer suporte estratégico, o que resulta em exposição inadequada, margens desproporcionais e baixo giro. A presença de profissionais dedicados à construção da categoria pode transformar a forma como esses produtos são percebidos e vendidos no ponto de venda, favorecendo sua competitividade e escala”, destaca Filgueira. A análise do GFI também inclui recomendações em P&D. Para além de avanços sensoriais, como sabor e textura, o estudo aponta que a formulação dos produtos deve considerar a simplificação das listas de ingredientes, com foco em funcionalidade, custo acessível e clareza para o consumidor. Isso exige uma abordagem mais estratégica: alinhar o propósito da formulação ao posicionamento do produto — seja ele indulgente ou saudável — e entender profundamente as expectativas do público-alvo. O Projeto Lâmpada fornece um mapeamento profundo, mas sobretudo uma agenda de possibilidades. Seu valor está menos em apontar os entraves e mais em propor saídas. Trata-se de um esforço que conjuga escuta qualificada, leitura estratégica do mercado e compromisso com a transformação do sistema alimentar. A mensagem final do estudo reforça esse posicionamento: é possível superar os limites atuais com articulação multissetorial, visão de longo prazo e decisões coordenadas. O Brasil com sua biodiversidade, capacidade agrícola, força empresarial e capital científico, pode ocupar uma posição relevante na transição global para dietas mais sustentáveis. O que falta, segundo o GFI, é destravar. E o Lâmpada indica por onde começar. Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. 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ELIZABETH AUGUSTA CARVALHO MATIAS
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FONTE: https://gfi.org.br