Aproveitando a recente passagem do “Dia Mundial da Anatomia”, comemorado no último dia 15 de outubro, faz-se necessário discutir a importância da doação voluntária de corpos para o ensino e a pesquisa nas áreas de Ciências Biológicas e da Saúde. A data escolhida para homenagear a arte da dissecação faz alusão à morte do anatomista Andreas Vesalius, que atuou no período da Renascença e faleceu, nessa data, no ano de 1564.
Acredita-se que, a partir de visitas aos patíbulos e aos cemitérios, o médico belga tenha adquirido parte de seu vasto conhecimento anatômico, culminando com a publicação do seu livro: De Humani Corporis Fabrica, obra-prima que lhe conferiu a alcunha de “Pai da Anatomia Moderna”. A mente curiosa, o domínio do latim, o estudo de obras clássicas e o contato com cadáveres permitiram a Vesalius contestar e reformular conceitos anatômicos e fisiológicos ultrapassados que perduravam por séculos.
Atualmente, os cadáveres podem ser obtidos pelas instituições de ensino por meio de doação direta ou por recebimento de corpos não reclamados (evita-se aqui utilizar o termo “indigente” por questões humanísticas). No primeiro caso, a pessoa manifesta a vontade de doar seu corpo ainda em vida para estudos post-mortem ou essa liberação é feita pelos seus familiares.
Diversas universidades do país contam com programas para conscientização e realização da doação, bem como para o recebimento adequado desses cadáveres. Os corpos não reclamados são aqueles que, após 30 dias do falecimento, não foram procurados pela família e nem por pessoas próximas. Nesses casos, a distribuição dos cadáveres é feita por ordem de inclusão das instituições em órgãos específicos e fica sujeita a um rodízio cronológico.
No Brasil, embora a utilização do cadáver não reclamado para fins didáticos e científicos esteja prevista na Lei nº 8.501 de 1992, ainda existe um déficit no número de corpos disponíveis para estudos nas universidades. Elencam-se alguns fatores para essa situação, tais como: a crescente abertura de novos cursos no Ensino Superior, os entraves éticos e os religiosos para a doação, a falta de conhecimento da população em geral sobre essa possibilidade e as formas de fazê-la ainda em vida.
A doação de corpos para instituições de ensino contribui para a formação de diversos profissionais que precisam compreender a fundo a Anatomia Humana. O estudo em cadáveres é imprescindível para uma formação de qualidade, pois permite a avaliação mais precisa das variações anatômicas, das texturas, da noção de profundidade, das cores e das correlações entre as estruturas corporais. Por mais que simuladores e modelos sintéticos sejam importantes, ainda são incapazes de reproduzir fidedignamente a complexidade do corpo humano.
Felipe de Lara Janz é Farmacêutico, doutor em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, pós-doutor em História da Ciência na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo e professor de Anatomia na UniCesumar em Ponta Grossa (PR).
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LUAN ARRUDA MANZOTTI
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