24/10/2024 às 11h56min - Atualizada em 26/10/2024 às 08h03min

STF, a tributação sobre receitas financeiras e o debate da anterioridade nonagesimal

MURILO DO CARMO JANELLI
Foto: Guilherme Lattanzi

*Guilherme Lattanzi*
 

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7342, movida pela ABIMAQ (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), trouxe à tona questões centrais do direito tributário e do princípio da anterioridade nonagesimal. O processo, impetrado em janeiro de 2023, questionou a validade do Decreto nº 11.374/2023, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que restabeleceu as alíquotas anteriores do PIS e da COFINS sobre receitas financeiras, após uma breve redução determinada por decreto do ex-presidente Jair Bolsonaro.
 

A principal argumentação da ABIMAQ baseou-se na alegação de que a revogação da redução das alíquotas do PIS e da COFINS violava o princípio da anterioridade nonagesimal, previsto no artigo 150, inciso III, alínea "c", da Constituição Federal. Esse princípio estabelece que qualquer alteração em tributos só pode ser aplicada após um intervalo mínimo de 90 dias, a fim de garantir previsibilidade e estabilidade aos contribuintes. A ABIMAQ argumentava que o Decreto nº 11.374/2023, ao revogar uma redução tributária em vigor desde o início de 2023, deveria respeitar esse prazo.
 

No entanto, o STF, em sua decisão unânime, rejeitou o pedido da ABIMAQ. O relator da ação, ministro Cristiano Zanin, argumentou que a norma de Lula não configurava um aumento de tributo, mas apenas a restauração das alíquotas de 0,65% para o PIS e 4% para a COFINS, que já estavam previstas no Decreto nº 8.426/2015. Zanin destacou que o princípio da anterioridade nonagesimal não se aplicava ao caso, pois o decreto de Bolsonaro, que havia reduzido as alíquotas, foi anulado antes de ter efeito prático duradouro.
 

A decisão teve repercussões políticas e econômicas significativas. De um lado, empresas, especialmente do setor industrial, foram pegas de surpresa pela revogação de uma medida que aliviaria a carga tributária sobre receitas financeiras. De outro, o governo Lula, ao justificar a restauração das alíquotas, argumentou que a medida era crucial para manter a arrecadação federal e evitar um impacto orçamentário negativo.
 

A manutenção das alíquotas mais elevadas do PIS e da COFINS gerou discussões sobre a necessidade de reformas tributárias mais amplas no Brasil. Para a ABIMAQ e outras entidades empresariais, a decisão frustra expectativas de redução de custos, sobretudo num contexto de recuperação econômica pós-pandemia. Por outro lado, a decisão reafirma a segurança jurídica ao retomar parâmetros já estabelecidos e garantir previsibilidade nas contas públicas.
 

A ADI 7342 também reabriu o debate sobre o alcance das garantias constitucionais que protegem o contribuinte contra mudanças abruptas na legislação tributária. Apesar de o STF ter reafirmado a validade das alíquotas restauradas, a controvérsia sobre o uso do princípio da anterioridade nonagesimal não foi completamente sanada. A decisão sugere que, em certos casos, o princípio pode ser relativizado, especialmente quando não há aumento efetivo de tributo, mas sim uma restauração de normas vigentes.
 

Essa questão permanece relevante para futuras decisões do Supremo, que terá que equilibrar a proteção ao contribuinte com a necessidade de ajustes fiscais impostos pelo governo. A ADI 7342, portanto, destaca a complexidade do sistema tributário brasileiro e a contínua tensão entre as necessidades arrecadatórias do Estado e os direitos dos contribuintes.
 

 * Guilherme Lattanzi é advogado da Elebece Consultoria Tributária.


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