Parece que vemos a história se repetir. Da mesma forma que as mulheres estiveram proibidas de praticar durante 38 anos o tradicional futebol de campo, a modalidade paradesportiva traz outras barreiras para as mulheres cegas que praticam o esporte. As políticas de incentivo à prática do futebol de cegas, os campeonatos e torneios ainda são poucos, e por conta dessa falta de fomento, mais uma vez a modalidade não foi considerada para as Paralimpiadas de Paris 2024.
A pesquisa ''Futebol de cegas e a luta pela igualdade de gênero'', desenvolvida por Wagner Xavier de Camargo, mostra que historicamente as mulheres cegas foram direcionadas para o golbol e para o atletismo, por conta de uma ideia preconceituosa da sociedade, de que as habilidades da mulher cega não foram desenvolvidas para o futebol, sendo o golbol uma opção mais ''segura''.
A história da modalidade começa a ter registros apenas em 2021, quando Alemanha, Inglaterra e Itália formaram seleções femininas para uma competição na Europa. Em 2023, em Birmingham na Inglaterra, aconteceu o primeiro Campeonato Mundial de Futebol para cegos, no entanto, somente os times masculinos disputaram.
No Brasil, a primeira equipe feminina de futebol para cegas foi formada em 2009, por meio da associação Urece Esporte e Cultura para Cegos, localizada no Rio de Janeiro. No entanto, a iniciativa não seguiu adiante. Em 2022, a Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais (CBDV) organizou o I Festival de Futebol de Cegas, que reuniu 26 atletas de diversos estados em uma série de treinamentos e jogos no CT Paralímpico Brasileiro, em São Paulo. No mesmo ano, foi criada a primeira equipe feminina na modalidade pela Associação Desportiva de Futsal do Distrito Federal (ADEF).
Esse ano, o estado do Rio Grande do Sul lançou a primeira equipe feminina de futebol de cegas no estado, uma iniciativa da Secretaria de Esporte e Lazer de Canoas, que abriga a sede da Associação Gaúcha de Futsal para Cegos (Agafuc).
Mas e o golbol, não é futebol?
Não! Por mais que ambos esportes sejam baseados na percepção auditiva das atletas, as modalidades possuem dinâmicas, pontuação, estratégias e quantidade de jogadoras diferentes. Além disso, existe um ponto fundamental que é muito diferente: a bola, que possui formato e pesos muito diferentes, tendo a única semelhança um guizo que emite um som, a fim de ajudar a orientar as jogadoras em quadra.
Na verdade, assim como no tradicional futebol, argumentos que tentam justificar a não existência do futebol para atletas cegas, agem como nuvens de fumaça tentando ocultar o cenário misógino que a modalidade enfrenta.
No entanto, por outro lado, as atuais gerações de atletas da modalidade lutam para criar oportunidades para as futuras gerações e romper com a cultura preconceituosa. Um exemplo é a segunda edição do Festival de Futebol Cegas, que pode ocorrer ainda esse ano segundo dados da CBDV. Também é cogitado um segundo mundial em 2023, e mesmo que o Brasil não consiga participar, porque ainda não tem um time consolidado, é um avanço para a modalidade como um todo e também uma forma de incentivo para que nosso país consiga desenvolver melhor esse esporte.
No presente, as atletas com deficiência visual, no Brasil e no mundo, lutam para a total implementação e reconhecimento da modalidade, para que as futuras jogadoras colham torneios, campeonatos e paralimpíadas na categoria futebol para cegas.
*Priscila Gregatti é fundadora de uma escola de futebol para meninas em São José dos Campos, chamada Quero Jogar Futebol Feminino
Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
ALVARO CAMPAGNOLI NETO
[email protected]