25/11/2024 às 12h00min - Atualizada em 26/11/2024 às 00h05min

Luta fora dos ringues e tatames: o reconhecimento do kickboxing no Brasil

“O Brasil ainda é um país que visa os grandes, mas não entende que sem os pequenos os grandes não existiriam” diz Christian Andreossi sobre a luta pela visibilidade esportiva no país.

Victoria Maciel
Luta de Point Fight entre Brasil e México no pan-americano de kickboxing em Santiago, Chile (2024) - Foto por: Lucivaldo Rocha
A Confederação Brasileira de Kickboxing (CBKB) é uma das organizações esportivas mais influentes do país desde sua fundação, em 1987. Responsável pela homologação de eventos estaduais e nacionais, também desenvolve projetos de incentivo à prática de kickboxing para pessoas de diferentes faixas etárias e classes sociais, além de proporcionar a possibilidade dos atletas brasileiros de alto rendimento de levarem o nome do país a competições internacionais de alto nível.

A CBKB é liderada por Paulo Zorello, conhecido como um dos pioneiros do kickboxing no país, foi um dos maiores atletas da modalidade Full-Contact nos anos 80, e detentor de três títulos mundiais pela Associação Mundial de Organizações de Kickboxing (WAKO – sigla em inglês). Zorello também é presidente da WAKO PANAM (região panamericana) e Vice-presidente da WAKO IF, o que fortaleceu as ligações internacionais do kickboxing brasileiro, que passou a ser visto como uma verdadeira potência a nível mundial.

Em entrevista com Zorello, o gestor aponta as vantagens que o Brasil têm em termos de difusão de conhecimentos e competições “Exercendo a presidência da confederação pan-americana, conseguimos colocar o Brasil numa condição diferenciada no país, quando você têm essa força de gestão, você aumenta o intercâmbio com outras nações, fortalecendo sonhos e abrindo caminhos.”

Anualmente, a WAKO tem promovido seminários técnicos, arbitrais e de gestão. Para Zorello, o evento acontecer em solo brasileiro é uma chance de fortalecer ainda mais a visibilidade do kickboxing e sua infraestrutura.

“Recebi uma proposta desse encontro ser realizado em abril de 2024 no Brasil, claramente aceitei a ideia, vai ser uma grande vantagem para o kickboxing no país”, afirma Zorello, que acredita que o evento colocará o Brasil no centro das atenções do esporte, atraindo investimentos e abrindo portas para novos talentos.

Com o reconhecimento da CBKB e sua ligação com a WAKO, vários estados começaram a criar suas próprias Federações e Delegacias. A criação dessas entidades contribuiu para o fortalecimento do Kickboxing no Brasil, levando cada vez mais uma imagem positiva para a arte marcial, ou seja, um esporte de disciplina, técnica e respeito.


Christian Andreossi reflete sobre gestão, patrocínio e os rumos do kickboxing brasileiro



Christian Andreossi e Hamilton Machado (2006) - Foto cedida pelo entrevistado.

Com uma carreira de mais de 30 anos no esporte, Christian Andreossi, profissional de Educação Física e um dos atuais diretores da Delegacia de Kickboxing de São Paulo, conta sobre a popularidade da modalidade no Brasil e como os atletas têm dificuldades em construir uma carreira esportiva por falta de apoio financeiro e reconhecimento.

Pergunta – Poderia começar contando um pouco sobre sua trajetória profissional no Kickboxing e as etapas que marcaram sua carreira?
Resposta – “Iniciei meus treinos de kickboxing por cerca do ano de 1989, competi até 2007 no pan-americano, ficando em 3º lugar. Me tornei presidente da antiga federação de Kickboxing de São Paulo (FESPKICK) entre 2009 até 2012, iniciei os trabalhos como diretor de arbitragem da CBKB em 2007 a convite do atual presidente Paulo Zorello e atuei como diretor nacional de kickboxing de 2007 até 2016. Também fui diretor profissional de um dos maiores eventos de kickboxing profissional da américa látina com enfoque na modalidade K-1 Styles, o WGP, desde sua criação, até 2015. Atualmente sou um dos diretores da Delegacia de Kickboxing de São Paulo, juntamente com Eduardo Martinelli e Samuel Matiolli.”

Pergunta – Durante sua trajetória na modalidade, como você acredita que o Brasil se posiciona no cenário internacional do Kickboxing?
Resposta – Atualmente o kickboxing brasileiro evolui e vêm evoluindo absurdamente a cada dia ou ano, no aspecto físico, mas muito mais no aspecto técnico. Acredito que isso se deva pela maior participação dos atletas e técnicos em eventos internacionais.  Isso ajuda a entender como os adversários estão trabalhando tecnicamente do outro lado do mundo.  O Brasil já sediou um Campeonato Mundial aqui no Guarujá, na época eu tinha acabado de deixar a presidência da FESPKICK, mas continuava como diretor nacional de arbitragem, isso por volta do ano de 2013. Com isso, parece que as portas se abriram para os brasileiros no cenário internacional, pois todos achavam que o kickboxing do Brasil era praticado por "selvagens". A partir dali mostramos que tínhamos qualidade e garra, o que foi a porta de entrada para o cenário mundial. O diferencial dos brasileiros acredito que está em não se deixar derrotar e correr atrás, e também a forma como se adapta durante uma luta, para mudar e buscar o resultado. Vejo que o "jogo" dos brasileiros não apresenta um mesmo padrão em todos os rounds ou de uma luta para outra e isso incomoda muito os adversários europeus.”

Christian ainda cita conquistas recentes pelos atletas brasileiros de kickboxing no cenário internacional: -"O Brasil vêm se destacando, com base nesse último campeonato pan-americano, realizado no Chile do dia 30 de outubro a 3 de novembro, das 6 categorias de ringue, o Brasil classificou 5 atletas para o World Combat Games, que será realizado em 2025 na China e recentemente o atleta Hector Santiago da minha equipe Seven Fight Team, conquistou na Argentina o cinturão mundial de kickboxing profissional na modalidade Low Kicks, categoria 62,200 kg, contra um atleta da casa."



Christian Andreossi ao lado de Hector Santiago segurando seu cinturão mundial de WAKO PRO - Foto retirada de sua conta no Instagram: @chrisseven.pro

Pergunta – Essa capacidade de imprevisibilidade dos brasileiros tem inspirado mudanças nos métodos de treinamento aqui no Brasil? De que forma você acredita que essa flexibilidade é trabalhada e incentivada pelos técnicos e pela CBKB?
Resposta –
“Sim, as mudanças são vísiveis, e estão acontecendo. Mas infelizmente, ainda temos problemas com professores que não gostam de se atualizar. A CBKB vêm investindo já a algum tempo em seminários técnicos práticos aberto a professores, atletas e árbitros. Mas infelizmente não são todos que entendem a importância desses eventos para sua capacitação.”

Pergunta – Muitos atletas creem na necessidade de construir uma imagem forte na mídia para conseguir patrocínios. Como você vê essa situação de visibilidade para a garantia de um apoio financeiro mais consistente?
Resposta - “Nem sempre a publicidade via mídias sociais seja impactante para conseguir ajuda, lógico que tem seu valor, quanto mais fizer, mais visibilidade o atleta em questão terá. Mas o esporte amador e não só o kickboxing é visivelmente negligenciado pelos governos, principalmente os que não estão nas olimpidas atualmente ou aparecendo na mídia constantemente. Os atletas ainda precisam correr atrás da ajuda de pequenos e microempresários (que são os que mais ajudam), parentes e amigos, fazem rifas de materiais ou conseguem apoio em alguma loja que doa um serviço para que eles façam suas rifas e consigam verbas para custearem seus gastos. O Brasil ainda é um país que visa os grandes, mas não entende que sem os pequenos os grandes não existiriam. O governo estadual criou o bolsa talento esportivo para atletas amadores de diversas modalidades, mas infelizmente não são todos que dão a entrada, que são contemplados e conseguem a ajuda e quando conseguem é através de sorteio. (Vai saber como é este sorteio né?). O problema é que o governo federal a cada ano baixa a porcentagem de repasse diminuindo as verbas do esporte, sendo que o esporte é o meio mais rápido de promover saúde para a população, desafogando o SUS.  Eles ainda não entenderam que para se tornar olímpico, precisa passar pelo Amador. Não tem outro caminho. Então, precisamos faze-los acordar para esta realidade. Enquanto isso resta ao atleta amador, correr mais e mais, mesmo que não seja atleta de corrida, para conseguir ajuda de custo.”

 

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VICTORIA REGINA MACIEL SUARES
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