26/08/2024 às 11h01min - Atualizada em 27/08/2024 às 08h03min

Diagnóstico precoce é fundamental para conter efeitos dos chamados “movimentos involuntários”

Neurologista da Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil (SBNI) explica como identificar distúrbios do movimento e alerta para casos pós infecção de garganta

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Os distúrbios do movimento em crianças são condições neurológicas que afetam a capacidade de realizar movimentos voluntários e coordenados, o que pode impactar significativamente a vida dos pequenos e de suas famílias. Eles tendem a se manifestar de diversas formas com desdobramentos clínicos muito específicos e que precisam ser analisados “caso a caso”.

O diagnóstico precoce de distúrbios do movimento em crianças é fundamental para um tratamento eficaz e melhor qualidade de vida. Os pais desempenham um papel vital nesse processo, observando e identificando quaisquer movimentos anormais que seus filhos possam apresentar. “É essencial que os pais estejam atentos a qualquer movimento diferente que a criança passe a apresentar. Alguns sinais de alerta incluem desvio do olhar (pode ser crise epiléptica ou crise distônica), piscamentos excessivos, tremores, movimentos do tipo torção nas mãos ou pés, fraqueza de um lado do corpo e alterações na marcha, como tropeços frequentes ou dificuldade para andar em qualquer idade ou momento do dia. É importante ressaltar que vídeos caseiros dos movimentos involuntários podem facilitar o diagnóstico por um neurologista infantil ou médico habituado a avaliar neurodesenvolvimento, uma vez que a criança pode não exibir os mesmos sintomas durante a consulta”, ressalta a neurologista infantil Simone Amorim, da Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil (SBNI).

O diagnóstico começa com a história clínica detalhada e exame neurológico, complementado por exames de imagem (ressonância magnética ou tomografia do crânio). A ressonância é crucial para identificar possíveis anormalidades estruturais no cérebro. Em alguns casos, dosagens enzimáticas e exames genéticos são necessários para um diagnóstico mais minucioso e preciso.

A principal causa de distúrbios do movimento na infância é a paralisia cerebral, condição que leva, muitas vezes, à incapacidade. Todos os distúrbios do movimento podem estar presentes na paralisia cerebral. “Quando isso acontece chamamos de paralisia cerebral discinética, que é quando há presença de vários distúrbios do movimento juntos. A distonia, coreia e atetose são os mais frequentes, mas a distonia é a mais grave. Cerca de 20% a 30% dos pacientes com paralisia cerebral são discinéticos”, explica a neurologista infantil.

Além da paralisia cerebral, doenças infecciosas como cerebelite, meningite, encefalite, infecção por streptococos e outras podem causar distúrbios do movimento em crianças.   “Importante chamar atenção para a Coreia de Sydehan, condição que pode surgir após uma infecção por streptococos, também conhecida como as infecções de garganta ou amigdalite. Neste caso, dias ou semanas após a infecção a criança começa a apresentar movimentos amplos de ombros, braços e mãos, além de movimentação involuntária na face e membros inferiores,” explica Simone Amorim.

A neurologista infantil Simone Amorim enumera os quadros mais comuns:

Distonia: Caracterizada por movimentos de torção involuntários e repetitivos, afetando mãos, pés, tronco e pescoço. Esses movimentos tendem a piorar com a ansiedade e o “estresse metabólico”. A principal causa de distonia na infância é a paralisia cerebral, mas causas infecciosas e genéticas também são frequentes na faixa etária pediátrica. Não há distinção de sexo ou raça.
Coreia: Movimentos amplos e involuntários que lembram “uma dança”, principalmente dos ombros e quadris, sendo mais frequentes nos membros superiores; ela está frequentemente associada à atetose na infância.
Atetose: Consiste em movimentos menores e contínuos, principalmente das extremidades como mãos, pés e dedos.
Mioclonia: Movimentos abruptos e repentinos, como grandes sustos ou quedas, que podem ser epilépticos (derivados de descargas epilépticas vindas do córtex cerebral) ou não epilépticos, quando decorrem de alterações nos gânglios da base que são as estruturas responsáveis pelo controle dos movimentos voluntários.
Tiques: Movimentos normais feitos repetitivamente e de forma involuntária, como piscar de olhos, levantar de ombros ou emitir sons. São movimentos normais, fisiológicos, mas realizados de forma involuntária e inoportuna. Podem ser simples ou mais complexos. Os tiques são mais frequentes em meninos do que em meninas e o tem início em geral na faixa etária escolar de 6 a 8 anos.

Atualmente, a maioria dos tratamentos para distúrbios do movimento na infância é sintomática, focando no alívio dos sintomas através de medicações orais e injetáveis, como a toxina botulínica. Em casos mais graves e refratários, pode ser necessário recorrer a procedimentos cirúrgicos. No entanto, a abordagem terapêutica depende do diagnóstico específico. “Para distonias focais, por exemplo, a toxina botulínica pode ser suficiente, enquanto distonias generalizadas podem requerer uma combinação de terapias físicas, medicação oral e toxina botulínica, com a possibilidade de intervenção cirúrgica, se necessário. Casos genéticos, frequentemente, respondem melhor aos tratamentos cirúrgicos do que condições adquiridas, como a paralisia cerebral”, completa a neurologista infantil.

Distúrbios do movimento podem ter um impacto significativo na vida das crianças, afetando seu desenvolvimento social, emocional e acadêmico. Crianças com tiques, por exemplo, podem sofrer bullying e isolamento social. Pacientes com distonia podem experimentar dor intensa e dificuldades nas atividades diárias, como tomar banho, se alimentar e se vestir. Por isso, o olhar atento dos pais e o diagnóstico precoce são essenciais para proporcionar bem-estar, desenvolvimento adequado da criança e maior controle de movimentos na adolescência e vida adulta. “Tratamento precoce é o mais indicado, pois tempo e cérebro!”, finaliza Simone Amorim.
 

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BEATRIZ GRACINDO LUCAS
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