“Ele me abandonou com câncer.” Esta é uma das frases presentes no vídeo de Preta Gil que voltou a circular nas redes sociais. Ao contar o drama vivido durante o seu tratamento, em entrevista à influenciadora Blogueirinha (2023), a cantora, que faleceu no dia 20 de julho vítima de câncer colorretal, destaca que um dos motivos para o fim do relacionamento foi a falta de cuidado recebida por parte do cônjuge ao descobrir a doença.
Segundo uma pesquisa conduzida pelas universidades de Stanford e Utah, em parceria com o Centro de Pesquisa Seattle Cancer Care Alliance, dos Estados Unidos (2009), esta não é uma realidade isolada: ao analisarem os términos de um grupo com 515 pessoas, 20% aconteceram quando a mulher era a parte doente. Quando o adoecido era o homem, a taxa caiu para 3%. Concluiu-se que as mulheres têm seis vezes mais chances de ser abandonadas pelo marido do que os homens.
Porém, o que muitas pessoas desconhecem é que a atitude de não oferecer cuidado ao cônjuge enfermo no Brasil pode gerar uma multa por danos morais, como alerta a psicóloga jurídica Thayse Duarte:
“O que a Preta Gil relata nós chamamos de abandono afetivo direcionado à mulher. Do ponto de vista da psicologia jurídica, pode configurar uma forma de violência, com repercussões emocionais e até morais. A atitude também é uma quebra de dever relacionado ao cuidado, previsto no contrato de casamento. É possível que essa situação aconteça com ambos os sexos; no entanto, observamos, com base em pesquisas, que o abandono afetivo ocorre majoritariamente mulheres enfermas.”
Direitos do casamento
No casamento civil, o cônjuge adquire uma série de direitos assegurados por lei, previstos no Código Civil Brasileiro, como o direito à herança, à meação dos bens adquiridos durante a união (dependendo do regime de bens escolhido), à pensão alimentícia em caso de separação, à inclusão como dependente em planos de saúde, previdência e outros benefícios, além do direito à convivência familiar e ao cuidado mútuo. A legislação brasileira também garante a igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, como o dever de fidelidade, coabitação, mútua assistência e respeito, sendo a parceria construída sob bases jurídicas que visam assegurar proteção e estabilidade à família. Por isso, Thayse destaca a importância de se atentar ao tratamento do cônjuge durante um processo delicado como o tratamento de um câncer:
“Na perspectiva do Direito da Família, com base no Código Civil Brasileiro, existe essa obrigação mútua de assistência. Por isso, é importante analisar, em caso de separação, os motivos e, se for o caso, recorrer à justiça. Essa judiação do cuidado não é algo agradável de se atentar, principalmente em um momento delicado de adoecimento, mas é necessário, uma vez que essa situação escancara a diferença de papéis de gênero, na qual a função do cuidado é atribuída somente à mulher na sociedade, destaca.
Como a psicologia jurídica avalia um caso?
A psicologia jurídica contribui com o Judiciário ao oferecer avaliações técnicas que ajudam o juiz a compreender aspectos emocionais e subjetivos dos envolvidos no processo. Em casos de abandono afetivo por motivo de doença, por exemplo, o psicólogo pode avaliar os impactos psicológicos do abandono no paciente, analisando sintomas como depressão, ansiedade ou sentimento de rejeição, além de investigar se houve negligência afetiva e emocional por parte do cônjuge. Com base nesse laudo, o juiz pode considerar o dano emocional e psíquico como fundamentos para decisão em ações de indenização por abandono, fortalecendo a sentença com base em evidências psicológicas.
Sobre Thayse Duarte
Thayse Duarte é Psicóloga e professora, especialista em Avaliação Psicológica, Psicologia Jurídica e possui MBA em Neurociência e Psicologia Positiva do Desenvolvimento Humano. É servidora pública do Ministério Público da União – MPU, onde é Assessora Técnica Chefe em Perícias Psicossociais. Já trabalhou no Conselho Federal de Psicologia – CFP e esteve na Universidade de Harvard (Boston, EUA), onde concluiu um módulo de mestrado em psicologia como aluna ouvinte em Resiliência Psicológica. Hoje, ela ajuda centenas de alunos na plataforma Estratégia Concursos, com aulas de psicologia voltadas para a atuação jurídica.
Thayse está aberta para entrevistas e participações em matérias abordando diversos assuntos que envolvem comportamento humano. Sua experiência permite explicar de forma clara e acessível.
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MILENA SANT'ANNA DA SILVA
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