A história do povo hebreu, escravizado e dominado pelos egípcios por centenas de anos, tem algumas semelhanças com a história do povo negro que foi escravizado no Brasil e que hoje encabeça as taxas de mortalidade e desemprego no país. É um povo que se multiplica, mesmo em meio à exclusão social e à violência.
O professor Abdias do Nascimento, político e ativista dos direitos civis e humanos das populações negras brasileiras, afirmava que o genocídio do povo negro foi uma constante na construção do Brasil e continua até os nossos dias. É um projeto a longo prazo de exclusão e morte da população negra de todos os contextos visando a sua morte física e social.
Os últimos dados da Síntese de Indicadores Sociais, feita pelo IBGE, mostrou que uma porcentagem de jovens negras e pardas nem estudam nem trabalham. De acordo com a pesquisadora Denise G. Freire, isso acontece porque essas mulheres precisam ficar em casa tomando conta de filhos, parentes idosos ou doentes e acabam não conseguindo sair para buscar trabalho nem estudar. É o trabalho invisível e não remunerado que essas mulheres executam todos os dias que acaba impedindo que elas saíam para procurar emprego ou estudar.
A pesquisa do IBGE indica que esse problema afeta muito mais as mulheres negras e pardas da população. Atualmente, existem 4,6 milhões de mulheres negras nessa situação. Desse total, 23,2% são classificadas pelo IBGE como desocupadas, ou seja, fazem parte da força de trabalho, mas não conseguiram ocupação. Por outro lado, 76,8% estão fora da força de trabalho, isto é, elas não conseguem sair para procurar emprego ou estudar.
Uma outra pesquisa alarmante é o aumento de mortes entre os homens negros. De acordo com Freire, os homens pretos e pardos jovens, foram os que mais morreram. Em 2023, os jovens negros formaram a maioria das mortes do país com 17,3% do total de óbitos, em todas as faixas etárias. Foram 1.463.546 mortes em 2023, segundo o IBGE. Já as mulheres pretas e pardas são as segundas que mais morrem até os 9 anos de idade com 0,9% seguidas de 11,3% de homens brancos até os 69 anos.
O Instituto Sou da Paz fez um levantamento sobre a taxa de mortalidade entre 2012 e 2019 e comprovou que a taxa de mortalidade por homicídio de jovens negros foi de 6,5% maior que a taxa nacional. Além disso, um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) aponta que, das quase 35 mil mortes de jovens entre 2016 e 2020 no Brasil, 80% eram de negros.
Mas vidas negras importam. Nos últimos anos a população negra do país mais do que dobrou! Os resultados do censo 2022 revelaram que 55,5% da população se identifica como preta ou parda. Os pesquisadores acreditam que isso seja o reflexo de uma maior conscientização da população, porque cor e raça é uma percepção que as pessoas têm de si mesmas.
Mas, voltando a história dos hebreus, sabemos que eles acabaram sendo libertados da escravidão e puderam, finalmente, partir rumo à terra prometida. Para o povo negro do Brasil, infelizmente, ainda falta muito para que essa liberdade seja de fato uma possibilidade real de inserção na vida social do país. A falta de acesso à educação e ao trabalho também são formas de “matar” quando não sem tem nenhuma possibilidade de acesso a uma vida melhor. Cada povo tem o seu deserto e o nosso é longo.
*Maristela R.S. Gripp é Doutora em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professora do curso de Letras do Centro Universitário Internacional Uninter.
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JULIA CRISTINA ALVES ESTEVAM
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