A fome e a insegurança alimentar são fenômenos profundamente enraizados na desigualdade social e têm consequências que ultrapassam a dimensão física da saúde. A escassez de alimentos afeta diretamente o bem-estar psicológico. O impacto mental é particularmente severo, porque a alimentação não é apenas uma necessidade biológica, mas também está intimamente ligada ao equilíbrio emocional e ao funcionamento adequado do cérebro. A incerteza quanto à capacidade de acessar alimentos adequados e suficientes gera um estresse constante que desencadeia uma série de respostas emocionais negativas, agravando ainda mais a vulnerabilidade psicológica.
A ansiedade é uma das manifestações mais comuns entre indivíduos que enfrentam a insegurança alimentar. A preocupação contínua com a falta de alimentos e sobre quando e como conseguir a próxima refeição cria um estado de alerta permanente no cérebro. Esse estresse prolongado leva à ativação constante do sistema de resposta ao estresse, liberando hormônios como o cortisol, que em níveis elevados e crônicos, prejudicam a regulação emocional e aumentam a predisposição à ansiedade. Da mesma forma, a depressão é um transtorno frequente nessas condições. A sensação de impotência diante da incapacidade de suprir uma necessidade tão básica, quanto a alimentação, pode gerar sentimentos de desesperança e baixa autoestima.
Além dos efeitos psicológicos diretos da fome, há uma crescente constância de evidências nos últimos 10 anos, que sugerem que o eixo intestino-cérebro desempenha um papel crucial no desenvolvimento de transtornos mentais em indivíduos, como é o caso de uma revisão de artigos publicada em 2024, que conclui ser necessário desenvolver uma microbiota intestinal saudável, para que assim a homeostase garanta a regulação de neurotransmissores importantes a saúde mental. O intestino, frequentemente chamado de "segundo cérebro", está conectado ao sistema nervoso central por meio do nervo vago e é responsável por produzir neurotransmissores importantes como a serotonina, que regula o humor. Sendo a desnutrição e a falta de alimentos adequados capazes de afetar a composição da microbiota intestinal, podemos associar que estas teriam grande impacto na saúde mental.
O estresse crônico da falta de alimentos, aliado aos efeitos da desregulação do eixo intestino-cérebro, cria um ambiente propício para o desenvolvimento de transtornos mentais e alimentares, como o comer compulsivo, em resposta à insegurança alimentar. Para muitos, a incerteza quanto ao acesso regular à comida leva a comportamentos de compulsão alimentar, quando os alimentos estão disponíveis. Esse comportamento surge como uma resposta à privação prolongada e não é apenas uma resposta física à fome, mas também um mecanismo psicológico de compensação emocional frente à incerteza e ao estresse da insegurança alimentar.
Além disso, o impacto psicológico é amplificado em populações vulneráveis que, além de enfrentarem a fome, também lidam com questões como a exclusão social e a estigmatização. Políticas públicas voltadas para a erradicação da fome precisam incluir não apenas a provisão de alimentos, mas também o apoio psicológico às populações afetadas. O tratamento dos transtornos alimentares e mentais relacionados à insegurança alimentar deve ser uma parte integral das intervenções, garantindo que as pessoas tenham acesso não apenas à nutrição, mas também aos cuidados necessários para reconstruir sua saúde mental.
*Karoline Albini Schast é nutricionista, especialistas em comportamento e fitoterapia. Professora do Bacharelado de Nutrição do Centro Universitário Internacional Uninter.
Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
VALQUIRIA CRISTINA DA SILVA
[email protected]