Quando o silêncio grita: a urgência de preparar escolas para acolher, não ferir

*Bruno Luis Simão

JULIA ESTEVAM
21/07/2025 12h41 - Atualizado há 17 horas

Quando o silêncio grita: a urgência de preparar escolas para acolher, não ferir
Rodrigo Leal

A recente notícia sobre o menino Valentim, uma criança autista de apenas 4 anos amarrada e presa no banheiro por uma professora em um centro de educação infantil no município de Araucária (PR), provocou indignação em grande parte da sociedade. O episódio não é apenas um caso isolado de violência, mas um retrato alarmante do despreparo de muitas instituições educacionais para lidar com crianças neurodivergentes. O que deveria ser um espaço de cuidado, segurança e desenvolvimento transformou-se em cenário de negligência e violação de direitos.

Valentim é uma criança não verbal – Nível III de Suporte, o que agrava ainda mais a situação: ele não pode expressar com palavras o que sentiu ou relatar outras possíveis situações de maus-tratos. Sua condição, longe de ser respeitada, foi tratada com violência e desumanidade. Sua mãe, como qualquer responsável, vive agora com a angústia de não saber o que mais pode ter ocorrido nos bastidores silenciosos da escola.

Embora o Estado do Paraná possua uma legislação voltada à proteção e inclusão de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), criada há um ano, os fatos demonstram que a efetivação desses direitos está longe de ser realidade. A existência da lei, por si só, não garante segurança nem qualidade na inclusão escolar. O grande obstáculo é o despreparo de muitos profissionais da educação que, por falta de formação adequada, não sabem como lidar com crianças neuroatípicas de maneira respeitosa, empática e pedagógica.

O foco do debate precisa ir além da responsabilização individual da professora — cujo ato, evidentemente, é inaceitável. É necessário olhar criticamente para o sistema como um todo. Quem a contratou? Que tipo de capacitação ela recebeu? Quais são os protocolos da escola para acolher e trabalhar com crianças com necessidades específicas? Há suporte psicológico, orientação técnica e acompanhamento profissional? Sem respostas claras a essas questões, os casos de negligência e violência tenderão a se repetir.

Infelizmente, muitos educadores ainda encaram crianças com TEA como "problemas" a serem controlados e não como sujeitos que aprendem e se desenvolvem de maneira distinta. Isso não é apenas uma falha pedagógica, mas um reflexo de uma cultura institucional excludente. Em vez de construir ambientes inclusivos e sensíveis às particularidades de cada aluno, parte das escolas segue operando sob uma lógica autoritária e homogeneizadora.

A educação inclusiva não pode se limitar ao discurso. É urgente implementar ações práticas: formação continuada obrigatória para professores, políticas públicas de acompanhamento multidisciplinar nas escolas, recursos didáticos adaptados e, principalmente, uma mudança na postura institucional diante da diversidade. A presença de alunos com deficiência não deve ser vista como um desafio extra, mas como parte natural da realidade escolar.

Além do ambiente educacional, há também um trabalho de conscientização a ser feito na sociedade. Ainda é comum ver comportamentos atípicos sendo alvo de olhares desconfiados, julgamentos e até piadas. A ignorância sobre o autismo, em suas múltiplas manifestações, contribui para a perpetuação de preconceitos e para o isolamento de famílias que lutam diariamente por respeito e compreensão.

O silêncio de Valentim grita por justiça, por mudança e por empatia. Sua dor não pode ser ignorada. O sistema educacional brasileiro precisa, com urgência, deixar de tratar a inclusão como um favor ou um desafio pontual e passar a encará-la como um direito inegociável. Que esse caso não seja mais um a ser esquecido nas estatísticas, mas sim um ponto de virada para uma educação mais humana, consciente e verdadeiramente acolhedora.

*Bruno Luis Simão é licenciado em Pedagogia, Psicopedagogia, Educação Física, Artes visuais e Normal superior com habilitação em Educação Infantil. Especialista em Psicopedagogia, Ludopedagogia, Psicomotricidade, Neuropsicopedagogia e Educação Especial e Inclusiva. É mestre em Educação, Mestrando em Artes e professor da Área de Educação, da Escola Superior de Educação No Centro Universitário Internacional Uninter


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