Inteligência Artificial e Desemprego Tecnológico: especialista analisa o direito do trabalho diante deste novo paradigma

O cenário preocupa juristas e especialistas em relações laborais, que veem a necessidade de um marco regulatório protetivo e equilibrado

FERREIRA ANTUNES
26/05/2025 13h16 - Atualizado há 1 mês

Inteligência Artificial e Desemprego Tecnológico: especialista analisa o direito do trabalho diante deste
Divulgação

A rápida ascensão da inteligência artificial generativa e de sistemas automatizados está reformulando o mercado de trabalho em escala global. Profissões tradicionalmente ligadas a atividades administrativas, produção de conteúdo, atendimento ao cliente e até mesmo áreas técnicas do Direito vêm sendo impactadas por softwares capazes de realizar tarefas humanas com rapidez, precisão e sem vínculo empregatício.

No Brasil, ainda há escassa normatização sobre o papel das IAs nas relações de trabalho. O cenário preocupa juristas e especialistas em relações laborais, que veem a necessidade de um marco regulatório protetivo e equilibrado. Para o advogado Bruno Gallucci, especialista em Direito do Trabalho, “o desafio contemporâneo não é impedir o avanço tecnológico, mas garantir que ele ocorra dentro de parâmetros legais que assegurem a dignidade do trabalhador humano”.

“Hoje, há setores inteiros — como os de atendimento por chat, revisão textual, produção de conteúdo musical e visual — sendo substituídos por IA generativa, sem que se discuta o impacto sobre os empregos, as remunerações e os direitos trabalhistas correlatos”, afirma Gallucci. “A legislação trabalhista brasileira, fundada sobre a valorização do trabalho humano como princípio constitucional, precisa ser atualizada para reconhecer e regular essa nova realidade.”

Decisões automatizadas e responsabilidade do empregador

Com a popularização de algoritmos de triagem de currículos, avaliações de desempenho e até desligamentos, surge uma dúvida fundamental: quem responde por um erro cometido pela IA?

Para Bruno Gallucci, a responsabilidade permanece sendo da empresa. “Se a ferramenta tecnológica utilizada no processo seletivo promove uma discriminação algorítmica, rejeitando candidatos com base em critérios enviesados, ou se um sistema automatizado de avaliação de desempenho resulta no desligamento injusto de um empregado, o risco da atividade — ainda que terceirizado à máquina — permanece sendo do tomador dos serviços.”
“Em última instância, é o empregador quem se beneficia economicamente da eficiência do sistema, e, portanto, deve arcar com os eventuais danos dele decorrentes, inclusive no que tange à reparação moral, à reintegração ou à nulidade de atos praticados sob vício algorítmico.”


Risco de exclusão e a urgência da requalificação

Outro ponto destacado por Gallucci é o chamado desemprego estrutural por obsolescência profissional. “Não se trata apenas de substituir o trabalhador por um robô. O problema é que, muitas vezes, o trabalhador sequer terá como se recolocar no mercado sem uma profunda requalificação. E a CLT, em sua redação atual, não impõe ao empregador qualquer dever nesse sentido”, alerta.

Ausência de marco legal e lacunas da CLT

Hoje, o único dispositivo que tangencia o tema é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que prevê no artigo 20 o direito de revisão de decisões automatizadas. Mas, segundo Gallucci, “a LGPD não foi pensada para o mundo do trabalho e, portanto, não cobre as nuances da subordinação algorítmica, da alienação dos dados laborais ou da manipulação de metas e produtividade por inteligência artificial”.

“Estamos falando de uma ruptura paradigmática: algoritmos que avaliam, fiscalizam e até penalizam empregados em tempo real, sem intervenção humana. Isso não pode ficar à margem da legislação trabalhista. É urgente que o Congresso Nacional e o Ministério do Trabalho abram espaço para essa discussão em caráter prioritário.”

Regulação internacional e o papel do Brasil

Diversos países da União Europeia já aprovaram ou estão debatendo leis específicas para regulação da IA no trabalho, com destaque para o AI Act, da União Europeia, que impõe níveis de risco e obrigações para empresas que usam algoritmos em processos decisórios.
No Brasil, o Projeto de Lei nº 2.338/2023, que estabelece o Marco Legal da Inteligência Artificial, está em tramitação no Senado, mas ainda não enfrenta com profundidade os impactos trabalhistas da automação.

“Se o Brasil não se antecipa, corre o risco de enfrentar uma judicialização massiva sobre decisões automatizadas, demissões injustificadas por algoritmos, e uma nova forma de assédio moral digital, em que metas inalcançáveis são impostas por sistemas cibernéticos”, alerta Gallucci.

Enquanto o mundo avança na automação, o Direito do Trabalho brasileiro é chamado a encontrar respostas urgentes para não apenas proteger o trabalhador, mas também fornecer segurança jurídica às empresas que desejam inovar sem incorrer em litígios. “Não se trata de romantizar o passado, mas de compreender que o progresso tecnológico deve ser humanizado. A inteligência artificial deve servir ao trabalho, e não substituir a dignidade do trabalhador”, finaliza Bruno Gallucci.

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