IA Generativa e o novo modelo de buscas: o conteúdo está em risco?

Por Lorenzo Nicodemo*

ANA SARTORI
14/05/2025 11h18 - Atualizado há 20 horas

IA Generativa e o novo modelo de buscas: o conteúdo está em risco?
MGID /Divulgação

Em meio à rápida ascensão da IA, surge a questão dos direitos autorais e da produção de conteúdo original. Atualmente, os modelos generativos de IA foram treinados com base na propriedade intelectual de milhões de publishers, autores e artistas sem permissão ou remuneração. Essa vasta e contínua extração de trabalho criativo impulsionou o crescimento das ferramentas de IA, enquanto aqueles que realmente criam o conteúdo do qual a IA depende, às vezes, podem ficar em desvantagem.

Somado a isso, as buscas no Google, como as conhecemos, estão prestes a sofrer uma mudança estrutural. O que antes era uma lista de links ordenados por relevância e otimização agora caminha para se tornar uma conversa com uma inteligência artificial. A plataforma tem testado o "AI Mode", ainda em uso restrito nos Estados Unidos e exclusivo para assinantes do Google One Premium, que inaugura uma nova fase no motor de busca, e pode reconfigurar o funcionamento da economia digital.

No novo modelo, no lugar da clássica página de resultados, o usuário recebe uma resposta direta, gerada por IA generativa, com um resumo da informação buscada.  O design se assemelha ao ChatGPT, com uma interface de bate-papo, em que a busca se desdobra em diálogo. Com isso, as pesquisas se tornam conversacionais. Os links continuam aparecendo, mas ficam mais escondidos — e, nesse processo, cada clique a menos vira um dilema a mais.

Se o usuário deixa de clicar no link, o site que gerou a informação não recebe tráfego. Sem tráfego, não há publicidade. Sem publicidade, não há receita. E sem receita, a própria criação de conteúdo é afetada. Com isso, a centralidade do Google se torna ainda mais absoluta, pois ele passa a atuar simultaneamente como buscador, servidor de anúncios, dono da maior base de dados analíticos (Analytics, Search Console), e, agora, intérprete da própria web.

Para sites jornalísticos, blogs de nicho, portais de serviços e outros produtores de conteúdo, essa mudança se torna uma ameaça. Estratégias de SEO, que regiam os esforços de marketing digital com base em palavras-chave e posição na SERP (Search Engine Results Page) perdem terreno, pois em vez de disputar espaço no topo dos resultados, agora será preciso criar conteúdos que a IA do Google e demais ferramentas de busca como o ChatGPT Search considerem nas suas respostas.

Vale lembrar que esse movimento acompanha o comportamento das novas gerações, especialmente a Gen Z, ao buscar informações. Muitos usuários começam suas pesquisas no TikTok, Instagram, ou mesmo nos próprios marketplaces como Amazon e Shopee, que entregam a informação já aplicada a um contexto, ao contrário do Google, que entrega vários links para compor a resposta.

Essa mudança de comportamento amplia ainda mais a pressão sobre os produtores de conteúdo. Afinal, como competir com uma resposta gerada por um sistema treinado para condensar o que há de mais relevante (e clicável) em toda a web? E, agora, como atrair atenção quando o Google e o ChatGPT passam a entregar, de forma sintética, a essência da informação logo na primeira resposta?

Mudam os motores, mudam as métricas

Além dos desafios por atenção, com os chatbots assumindo o protagonismo nas buscas, também será preciso reinventar as formas de mensurar o sucesso digital. Métricas tradicionais, como taxa de clique (CTR) ou páginas por sessão, podem ter seu valor afetado quando o tráfego deixa de existir ou se torna fraco. E há um agravante: o Google ainda não separa, nas ferramentas analíticas, o que é tráfego gerado por AI Overviews do tráfego orgânico tradicional, o que pode deixar os publishers sem entender de onde vem seu público ou como ajustar suas estratégias.
Assim, negócios que dependem de blogs para captar leads, por exemplo, precisarão repensar sua lógica de atração. A vantagem estará em oferecer aquilo que a IA ainda não consegue gerar: opinião, contexto, exclusividade e dados proprietários.

Vale considerar também que a IA generativa ainda erra. Um estudo da Columbia Journalism Review descobriu que os principais chatbots citavam fontes de notícias incorretamente 60% das vezes, enquanto a BBC encontrou erros significativos em mais da metade das respostas geradas por IA a consultas de notícias— em quase 20% dos casos, havia falsidades evidentes. A pergunta que se impõe é: se a informação gerada pela IA estiver errada, quem será responsabilizado?

Além da questão da veracidade, há o problema da visibilidade. Testes mostram que os links citados nos resumos por IA são empurrados para baixo ou colocados de forma discreta, muitas vezes depois de resultados de produtos e serviços do próprio Google. Isso levanta questões concorrenciais. A Comissão Europeia já apontou que o Google Search pode estar violando a Lei de Mercados Digitais por favorecer seus próprios serviços.
Enquanto isso, no Brasil, a discussão sobre regulação da IA avança a passos lentos e é possível que leve anos até que algo concreto seja implementado.

Como driblar os desafios?

Dessa forma, para manter-se relevante, há dois caminhos possíveis. Para marcas e publishers, o primeiro passo é apostar na diferenciação e na relação direta com o público. Modelos de conteúdo baseados em assinaturas, comunidades fechadas, newsletters e podcasts vêm ganhando força. O segundo é investir em dados proprietários (dados first-party). Quem conhecer profundamente sua audiência terá vantagem competitiva diante de algoritmos que ainda operam em bases amplas e genéricas.
Além disso, será fundamental dominar as novas ferramentas de IA — não apenas para se defender, mas para criar com mais eficiência. E o conteúdo precisará ser cada vez mais estratégico, com menos volume e mais profundidade. Ou seja, menos SEO e mais identidade.

O horizonte futuro

A revolução é imparável e, se hoje já temos a IA em operação, no horizonte, a computação quântica anuncia um novo salto possível. Ainda em estágio inicial, essa tecnologia já começa a ser usada em pesquisas de marketing, simulando comportamentos humanos com agentes digitais. Sua promessa é ampliar exponencialmente a capacidade de análise e decisão.

Se isso se concretizar, o trabalho humano — inclusive o criativo — será redefinido. Mas, até lá, é com a IA generativa que será preciso lidar. E ela já está desafiando o mercado. O Google e o ChatGPT Search estão, de certa maneira, redesenhando as regras do jogo. Quem quiser jogar, terá que aprender de novo. E rápido.

*Lorenzo Nicodemo é Head of Publisher Acquisition (Latam e Brasil) da MGID, plataforma global de publicidade.




 

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