Reduto do café especial em SP, Alta Mogiana aposta na fermentação para potencializar negócios

Diante de desafios climáticos e da volatilidade do mercado, a diversidade de produtos pode ser a chave para manter a competitividade e o lucro

IEDA RODRIGUES
25/02/2025 17h50 - Atualizado há 7 horas
Reduto do café especial em SP, Alta Mogiana aposta na fermentação para potencializar negócios
Divulgação

“Posso retornar depois porque agora vou torrar um café?”, perguntaTiago Donizete Rodrigues, um dos mais premiados produtores da fruta da Alta Mogiana. Sim, café é uma fruta e adora as condições edafoclimáticas, ou seja, de solo, clima e relevo dessa região ao norte do Estado de São Paulo mundialmente reconhecida pela qualidade singular na produção de cafés de excelência.Terceira geração de sua família a se dedicar à cultura em um  pequeno sítio em Santo Antônio da Alegria, município que faz divisa com Minas Gerais, ele já ganhou duas vezes o Concurso Estadual Qualidade do Café de São Paulo realizado pela  Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Em 2022, com café natural e, em 2023, com café fermentado.
Tiago, que também costuma figurar entre os primeiros colocados no concurso anual de qualidade de café da Associação de Cafés Especiais da Alta Mogiana (AMSC), lamenta que a safra de 2024 foi “baixa” e a deste ano, que era para ser “alta”, deverá ser menor ainda, como explica, por causa da seca e do calorão do ano passado. A última safra “alta” na região de fato foi em 2020, de acordo com o assistente agropecuário Geraldo Nascimento Júnior, que é engenheiro agrônomo e diretor da CATI de Franca e integra o Grupo Técnico do Café da CATI. A realidade na plantação de Tiago ajuda a explicar o porquê o consumidor brasileiro está pagando mais pelo café.
O café é uma commodity, ou seja, uma mercadoria básica no mundo todo. O preço no Brasil fica sujeito às oscilações no mercado internacional. “E como estamos acumulando safras baixas, nossos estoques de café gradualmente estão menores. Além disso, outros países grandesprodutores, como Vietnã, também tiveram quebra de safra por problemas climáticos”, conta o assistente agropecuário.
O Brasil, aindas segundo Geraldo, é o maior produtor, consumidor e exportador de café do mundo. O Estado de São Paulo, com cerca de 200 mil hectares, é o terceiro estado maior produtor do Brasil. “Pela ordem, as regiões de Franca, São João da Boa Vista, Marília, Ourinhos e Bragança Paulista são as maiores produtoras, respondendo por cerca de 80% do café paulista”, detalha.
De maneira geral, os cafezais paulitas são mecanizados, mas apenasuma pequena parte é irrigada, até porque não há oferta de água suficiente, acrescenta o assistente agropecuário. O aumento do preço do café, que recentemente bateu recorde na Bolsa de Nova York, pode levar a um crescimento da área plantada. Mas como é uma cultura de ciclo longo, plantios que sejam feitos agora vão levar pelo menos dois anos e meio para produzir. “Além disso, é preciso ter mudas, que atualmente são feitas sob encomenda. Então, não há como aumentar a produção de um ano para o outro”, agrava Geraldo.
É um cenário complexo, que depende muito das condições climáticas.“Se neste ano as chuvas vierem como o esperado, quem sabe, no ano que vem tenhamos uma safra “alta” e os preços voltem ao patamar normal”, analisa Geraldo, que acompanha cafeicultores da Alta Mogiana dando assistência técnica, inclusive Tiago, que acumula premiações.
Mesmo produzindo cafés especiais e com preços em alta, com a quebra na safra os produtores dessa região têm buscando alternativas para manter o lucro. E foi isso que levou Tiago a tomar duas decisões: montar uma pequena torrefação no seu sítio para, assim, vender parte do café especial que produz diretamente ao consumidor e começar a produzir café fermentado com marca própria. “Comecei a fermentar em 2022, após fazer curso na Associação de Cafés Especiais da Alta Mogiana. Na hora da venda, é um diferencial principalmente para as cafeterias. Tem comprador que chega até a gente, seja pela Internet ou aqui no sítio, por causa do café fermentado”, conta.

Leque de produtos
Martha Grill, gestora da Associação de Cafés Especiais da Alta Mogiana, entidade que representa mais de 5 mil produtores de São Paulo e Minas Geraisna busca dos melhores negócios para cafés de alta qualidade fora do sistema de commodities, confirma. “A Alta Mogiana produz cafés naturais, de alta doçura e corpo, em grande volume, que podem compor  blends de espressos vendidos no mundo inteiro. Então, do ponto de vista mercadológico, é importante para a região ter um leque maior de sensoriais. Ou seja, o café fermentado é mais uma opção para o exportador que já compra na Alta Mogiana. Ele também pode comprar um microlote fermentado, que tem aromas frutados, é mais complexo e que também tem público”, especifica.
Ela acrescenta que o consumidor de café fermentado é o jábebedor de café especial que procura um sensorial diferente. O café fermentado do Tiago, prremiado, tem essas características: “Tem fragrância e aroma de frutas e caramelo; sabor doce, acidez cítrica, corpo leve e finalização longa e doce”, afirma Rodrigo Esper de Pádua, degustador e avaliador do café do Tiago.
Para Martha, é um nixo de mercado que está crescendo. No concurso de qualidadade anual realizado pela Associação de Cafés Especiais da Alta Mogiana, em torno de 25% a 35% dos inscritos são fermentados.
Café especial, cuidados especiais
Tiago, que conta com a ajuda de seu pai no cuidado do cafezal, assim como do beneficiamento da fruta, ressalta que a fermentação também pode dar errado. “Se der errado, não desenvolve os aromas frutados, mas sim lácteos e aí a gente perde o lote”, afirma.
Em sua propriedade, Tiago fermenta poucas sacas de café em tambores, de forma similar à fermentação das amendôas do cacau para a produção de chocolate. Para esse processo, que consiste na  degradação natural da polpa e da mucilagem do fruto realizada por microrganismos, é necessário utilizar café especial.
E, para produzir café especial, além das condições de solo, relevo e clima é necessário cuidado com as plantas de café, com a colheita e com a secagem após a fermentação, que no sítio do Tiago é feita em terreiro suspenso. Para ser considerado especial, na avaliação o café tem de obter pontuação mínima  80 pontos de uma escala de até 100 em dez atributos como aroma, doçura, acidez, corpo, finalização, explica Martha, gestora da Associação de Cafés Especiais da Alta Mogiana, entidade que faz essa classificação. Para isso, é necessário matéria-prima pura, sem defeitos nos frutos, sem pedaços de outros materiais, como galhos e cuidado na secagem, ressalta.Diante dos desafios climáticos e da volatilidade do mercado, apostar na qualidade e na diversidade dos produtos pode ser a chave para manter a competitividade e garantir a sustentabilidade da cafeicultura na região.





 

Notícia distribuída pela saladanoticia.com.br. A Plataforma e Veículo não são responsáveis pelo conteúdo publicado, estes são assumidos pelo Autor(a):
IEDA APARECIDA RODRIGUES
[email protected]


FONTE: Ieda Rodrigues
Notícias Relacionadas »